Ride
©Mekkel.Richards
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Dez pérolas secretas da pop: volume 3

Discos subestimados, lados B de singles, canções que só saíram em edições de tiragem limitada, bandas-meteoro, que se apagaram antes de alguém reparar nelas. Algumas das melhores canções pop ficaram esquecidas nas margens da história

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Depois dos volumes 1 e 2, eis a terceira parte da colectânea Pérolas Secretas da Pop. Para amantes ou cépticos do estilo musical. 

Dez pérolas secretas da pop: volume 3

“Pop song”, de David Sylvian

David Sylvian não é um desconhecido, mas este single de 1989 passou quase despercebido, uma vez que não faz parte de nenhum dos álbuns de Sylvian e embora tenha sido lançado expressamente para promover a caixa/compilação Weatherbox, não foi incluído nela. O facto de ter surgido durante o interregno de 12 anos de álbuns em nome de David Sylvian que vai de Secrets of the Beehive (1987) a Dead Bees on a Cake (1999) também não ajudou. A canção surgiu como reacção irónica e subversiva de Sylvian ao pedido da sua editora, a Virgin, para escrever uma “canção pop”. O ritmo obsessivo e descarnado, a melodia reduzida ao mínimo, as aguadas de teclados atmosféricos da escola Eno/Hassell e as pinceladas de piano de imprevisibilidade jazzística, não poderiam estar mais longe dos padrões da canção “popular”.

“And Then”, dos Miracle Legion

Os Miracle Legion começaram como quarteto, mas a saída, após o álbum de estreia, Surprise Surprise Surprise (1987), do baixista e do baterista deixou o grupo reduzido a Mark Mulcahy (voz) e Ray Neal (guitarra). Foi uma crise que acabou por revelar-se benéfica, já que o duo teve de reinventar-se e logrou no despojado Me and Mr. Ray (1989) a sua obra mais original e inspirada, assente apenas em guitarra e voz, com complemento pontual e discreto de baixo e caixa de ritmos. O recrutamento de novo baixista e baterista conduziram ao álbum Drenched (1992), competente mas indistinto. A banda foi frequentemente comparada com os R.E.M. e há que reconhecer que “And Then”, proveniente de Me and Mr. Ray, tem afinidades genéricas com o som do grupo de Michael Stipe.

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“Heaven Knows”, dos It’s Immaterial

O duo John Campbell e Jarvis Whitehead praticava uma synth-pop ambiental, de cores quentes e meticulosamente orquestrada, que lançava um olhar desencantado sobre vidas anódinas na Grã-Bretanha suburbana: “No Verão passado, ouvi dizer que te mudaste para uma casa que fica para lá da circular e não tem espaço para as crianças brincarem [...] Acaso acordas à noite e sentes que estás a escorregar para longe de todos os teus sonhos?”. O refrão insiste que “as coisas vão correr bem, vai tudo correr bem”, mas a melancolia resignada da voz desmente tal optimismo. “Heaven Knows” faz parte do segundo álbum, Song (1990), de uma das bandas mais injustiçadas da história da pop – a escassa atenção suscitada pelos It’s Immaterial levou a que o seu terceiro álbum, House for Sale, gravado em 1992, nem chegasse a ser publicado e ficasse na prateleira até hoje.

“Sennen”, dos Ride

Os Ride estão longe de ser um segredo da pop, pois não só alcançaram alguma notoriedade como co-líderes do movimento shoegazer no início da década de 1990, como ganharam ainda maior projecção quando voltaram a juntar-se em 2014 (talvez por a imprensa musical ter sentido remorsos por não lhes ter dado a atenção merecida na primeira encarnação). O que é peculiar nos Ride é a tendência para remeter para o lado B de singles e EPs algumas das suas melhores canções, como é o caso de “Sennen”, que faz parte do EP Today Forever (1991). Sennen Cove é uma praia, popular entre surfistas, na ponta mais ocidental da Cornualha e é bem possível que a sua paisagem batida pelo vento e pelas ondas e as suas vistas desafogadas se tenham infiltrado nesta canção planante e sonhadora.

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“Buttercup”, dos Brad

“Buttercup” é a canção de abertura de Shame, o disco de estreia dos Brad, de 1993, e apesar de a banda contar com o guitarrista Stone Gossard, dos Pearl Jam, que estavam então no auge da popularidade, pouca gente deu pela existência desta banda – que tem, aliás, prosseguido a sua discreta existência até hoje. A banda, formada em 1992, contava com Shawn Smith (voz e teclados), Gossard, Jeremy Taback (baixo) e Regan Hagar (bateria) e com excepção do baixista, continua a ser este o seu núcleo. A diversidade de influências trazida pelos vários membros contribuiu para a criação de uma sonoridade original, onde se mesclam grunge, funk e soul e a que a original e expressiva voz de Shawn Smith dá um cunho inconfundível. “Buttercup” representa a faceta mais planante e despojada da banda: uma canção construída com um mínimo de gestos e, ainda assim, plena de dramatismo.

“Fine Friend”, dos Pale Saints

A canção faz parte de Slow Buildings (1994), o terceiro e último álbum dos Pale Saints, numa altura em que Meriel Barham (ex-Lush), que entrara para banda como guitarrista no final de 1990, substituíra (com vantagem) o fundador Ian Masters no papel de vocalista. Simultaneamente, a banda fora evoluindo para uma sonoridade mais espaçosa e onírica e “Fine Friend” está mais próximo dos Mazzy Star do que da matriz original dos Pale Saints. A versão que aqui se apresenta, que tem mais 1’40 do que a do álbum e é ainda mais enfeitiçante, surgiu em All Virgos Are Mad, um CD-mostruário lançado pela 4AD em 1994 por ocasião de um festival 4AD em Los Angeles.

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“Don’t Let It Fade”, dos Sunday’s Best

Os Sunday’s Best devem muito a uma rádio, não porque esta tenha martelado incessantemente as suas canções pela cabeça dos ouvintes dentro (sim, antes da internet a rádio tinha este poder), mas porque três dos seus quatro membros se conheceram quando trabalharam na KXLU, uma rádio universitária de Los Angeles, influente no meio “alternativo” californiano na década de 1990. A banda costuma ser arrumada no emo, uma classificação apressada que talvez decorra de uma interpretação superficial da combinação intensidade + melodias “orelhudas” do primeiro álbum, Poised to Break (2000). O segundo (e último), The Californian (2002), fez uma inflexão para terreno mais pop e mais melancólicos – é dele que provém esta pérola, sobre os mistérios e fragilidades do amor.

“Spies”, dos Crushed Stars

Os Crushed Stars são, basicamente, Todd Gautreau, que, em paralelo, se dedica à música electrónica e ao minimalismo, em projectos paralelos como Sonogram, Tapes & Topographies e o já extinto Tear Ceremony. “Spies” é a faixa de abertura de Gossamer Days (2007) e é típica da pop melancólica e planante dos Crushed Stars, algures entre a dream pop e o slow core, por vezes fazendo lembrar The Clientele. Os Crushed Stars lançaram oito discos nos últimos 16 anos, mas estes têm despertado a mesma atenção que a descoberta da enésima estrela de quinta grandeza na galáxia de Andrómeda.

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“Randy Quaid”, dos Desertshore

Os Desertshore são a banda de Phil Carney, guitarrista dos Red House Painters entre 1995 e 2001, e, efemeramente, dos Sun Kil Moon. Sendo um ex-parceiro de Mark Kozelek, não é de estranhar que este tenha acolhido os Desertshore na sua editora Caldo Verde e tenha produzido o seu álbum de estreia, Drifting Your Majesty (2010). No segundo, Drawing of Threes (2011), o envolvimento de Kozelek foi ainda maior, tocando baixo e cantando em seis das 10 faixas e desviando o som da banda do post-rock rendilhado e sereno do álbum anterior para o seu próprio território. “Randy Quaid”, cuja letra alude, en passant, ao actor com esse nome, é uma das faixas de que conta com Kozelek e é superior a quase tudo o que este tem feito (em nome próprio ou como Sun Kil Moon) nos últimos anos. Porém, como os Desertshore são uma banda quase invisível, poucos deram pela sua existência.

“Run”, dos Sui Sui Duck

“Run” faz parte do EP homónimo, de 2016, de uma jovem banda japonesa liderada pelo vocalista/guitarrista Yuta Shibuya. Apresentam-se a si mesmos como “simples. não simples. minimais. não minimais” e praticam uma pop-funk aveludada, fluida e incrivelmente cool (é o caso desta canção), com influências de dream pop (mais patentes em “Movie, do mesmo EP).

Pop/rock para todos

  • Música
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O pop-rock sofre de algum complexo de inferioridade face à música dita “erudita” e é por essa razão que alguns grupos vêem na actuação com uma orquestra clássica uma forma de ganhar respeitabilidade. 

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Há miúdos que, aos 18 ou 19 anos, já têm coisas para dizer, apesar da curta experiência de vida, e sabem construir canções com uma solidez que faz inveja a muito veterano.

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