Frank Sinatra
©William P. Gottlieb Collection (Library of Congress)Frank Sinatra
©William P. Gottlieb Collection (Library of Congress)

10 versões clássicas de “My Funny Valentine”: vol. 1

Não há canção mais apropriada para o Dia dos Namorados e há poucas mais populares – pelo menos 600 artistas diferentes gravaram dela 1300 versões. Nem todas são, claro, do gabarito destas dez, registadas entre 1953 e 1958

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O musical Babes in Arms, estreado na Broadway em 1937, foi um dos grandes sucessos de Richard Rodgers e Lorenz Hart: ficou em cartaz durante oito meses e teve 289 récitas, viu várias das suas canções – como “My Funny Valentine”, “Where or When”, “The Lady Is a Tramp” – converterem-se em favoritos dos cantores pop e dos jazzmen e foi transposto para cinema em 1939, sob a direcção de Busby Berkeley, um mestre das fantasias coreográficas, e com as irritantes crianças-prodígio Mickey Rooney e Judy Garland nos papéis principais. Numa daquelas bizarrias típicas de Hollywood, na passagem do palco para o grande ecrã quase todas as canções (incluindo “My Funny Valentine”) ficaram pelo caminho.

Há que reconhecer que, como declaração do amor de uma mulher (a personagem Billie Smith, no musical) pelo seu amado (Valentine LaMar), “My Funny Valentine” é pouco convencional: o aspecto dele é “risível” e pouco fotogénico (“unphotographable”), o seu “perfil está longe de ser grego” e a “boca é um pouco fraca”. Todavia, é “a obra de arte favorita” dela...

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10 versões clássicas de “My Funny Valentine”: vol. 1

Gerry Mulligan

Ano: 1953
Álbum: Gerry Mulligan Quartet vol. 2 (Pacific Jazz)

Em 1952-53, na Califórnia, o saxofonista barítono Gerry Mulligan liderou um quarteto sem piano que contou com o trompetista Chet Baker e que representa um dos cumes da carreira de ambos os músicos. Na ausência do suporte do piano, os dois sopros construíam um discurso entrelaçado e sinuoso, com um nível de entendimento telepático, mas o quarteto teve vida breve, pois Mulligan foi parar à prisão em resultado do seu vício em heroína. Quando de lá saiu, seis meses depois, Baker descobrira, entretanto, que a combinação do seu look de James Dean e da sua vozita asténica, dengosa e aflitivamente limitada enfeitiçava as raparigas e estava a facturar mais do que no quarteto com Mulligan, pelo que recusou o convite do saxofonista para reatar a colaboração e prosseguiu por conta própria (voltariam a reunir-se episodicamente em concerto em 1955 e 1974).

As gravações do quarteto Mulligan/Baker em 1952-53 deram origem a dois LP de 10’’ com o título Gerry Mulligan Quartet, que foram reeditados em CD com generosa adição de faixas extra, entre as quais está esta sublime e concisa versão que conta, além de Mulligan e Baker, com Carson Smith (contrabaixo) e Larry Bunker (bateria).

Frank Sinatra

Ano: 1953
Álbum: Songs for Young Lovers (Capitol)

No final de 1952 a carreira de Sinatra parecia estar acabada: os concertos do cantor que outrora arrastara multidões (sobretudo de raparigas) ficavam às moscas, e a sua editora, a Columbia, dispensou-o. Quando nada o faria prever, Sinatra reinventou-se: assinou contrato com a Capitol e registou uma série de oito álbuns com a orquestra de Nelson Riddle que são hoje considerados como o pináculo da sua discografia. O primeiro, Songs for Young Lovers, inclui a primeira (e talvez a melhor) de várias versões de “My Funny Valentine” que iria gravar na carreira.

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Sarah Vaughan

Ano: 1954
Álbum: The Rodgers & Hart Songbook (Mercury)

Escreve Ted Gioia no indispensável Jazz Standards (Oxford) que se gravaram mais versões jazzísticas de “My Funny Valentine” em 1954 do que na soma de todos os anos decorridos desde a estreia da canção.

Uma das primeiras do ano foi esta da “divina” Sarah com a orquestra de Richard Hayman, realizada a 10 de Fevereiro, em Nova Iorque. É uma gravação “desgarrada” que foi depois incluída em The Rodgers & Hart Songbook (1985), um álbum que compila gravações de várias sessões de Sarah Vaughan entre 1954 e 1958, com diferentes músicos.

Chet Baker

Ano: 1954
Álbum: Boston 1954 (Uptown Records)

É provável que tenha sido Baker a sugerir a Mulligan a gravação de “My Funny Valentine”, pois a composição já fazia parte do repertório do trompetista há alguns anos e ele não a perderia de vista ao longo da vida – legou-nos dela cerca de 40 registos. O mais célebre é o que realizou na sessão de 15 de Fevereiro de 1954 com Russ Freeman (piano), Carson Smith (contrabaixo) e Bob Neel (bateria) e que deu origem ao álbum Chet Baker Sings (Pacific Jazz) e que seria reproduzida numa miríade de compilações. As versões cantadas por Baker implantaram-se tão firmemente no imaginário que até nos esquecemos de que a canção foi concebida para ser cantada por uma mulher.

Quem não aprecie o fruste aparelho fonador de Baker, ficará mais bem servido por esta versão em que ele apenas toca trompete e foi gravada ao vivo numa transmissão radiofónica a partir do clube Storyville de Boston, a 16 de Março do mesmo ano, com os músicos da sessão de 15 de Fevereiro.

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Ben Webster

Ano: 1954
Álbum: Ben Webster with Strings (Verve)

O som sensual, caloroso e aveludado de Ben Webster é perfeito para a melodia de “My Funny Valentine”, como atesta esta gravação surgida originalmente no álbum Music for Loving, editado em 1954 pela Norgran, a editora de Norman Granz. O disco seria reeditado em 1956 na Verve, acoplado ao seu gémeo Music with Feeling, com o título Sophisticated Lady, que viria a ressurgir, em 1995, com faixas adicionais e acoplado a gravações, da mesma época, em nome de Harry Carney, no duplo CD Ben Webster with Strings (Verve).

Sim, é uma história complicada e, para a enredar ainda mais, apesar de os registos de 1954 contarem quase todos com uma secção de cordas arranjada por Ralph Burns, nesta faixa Webster tem apenas o discreto acompanhamento de piano, contrabaixo e bateria – “no strings”, portanto.

Miles Davis

Ano: 1956
Álbum: Cookin’ (Prestige)

Miles Davis também fez de “My Funny Valentine” uma peça do seu repertório e a canção até daria título ao um álbum gravado ao vivo no Lincoln Center em 1964. A sua primeira gravação é esta, de 26 de Outubro de 1956, que foi incluída no primeiro álbum do estupendo quinteto com John Coltrane (saxofone), Red Garland (piano), Paul Chambers (contrabaixo) e Philly Joe Jones (bateria) – que, nesta faixa é apenas um quarteto, pois Coltrane não entra.

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Ella Fitzgerald

Ano: 1956
Álbum: Sings the Rodgers & Hart Songbook (Verve)

Não há versões definitivas de canções e muito menos no jazz, mas é indesmentível que a série de Songbooks que Ella gravou para a Verve nas décadas de 1960-60 oferece leituras superlativas do material mais corrente dos principais compositores de standards. O Rodgers & Hart Songbook, com orquestra arranjada e conduzida por Buddy Bregman, não é excepção.

Jimmy Giuffre

Ano: 1956
Álbum: The Jimmy Giuffre Clarinet (Atlantic)

O clarinetista, saxofonista e arranjador Jimmy Giuffre (1921-2008) foi um dos mais originais músicos de jazz de todos os tempos: foi pioneiro do som West Coast no início da década de 1950, explorou formações instrumentais que nunca tinham sido ouvidas no jazz e foi pioneiro da improvisação livre (num trio com Paul Bley e Steve Swallow, no início dos anos 60).

A sua ousadia e inventividade está bem patente em The Jimmy Giuffre Clarinet, álbum de 1956 em que o jazz faz uma inédita aproximação à música de câmara. Em “My Funny Valentine”, o clarinete de Giuffre é acompanhado por Bob Cooper (saxofone e oboé), Dave Pell (saxofone e trompa) e Ralph Peña (contrabaixo).

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Carmen McRae

Ano: 1957
Álbum: After Glow (Decca)

Outra grande cantora dos 50-60s, num contexto intimista, com um trio de piano (Ray Bryant), contrabaixo (Ike Isaacs) e bateria (Specs Wright). McRae não se limita a ler partituras – tome-se atenção, por exemplo, ao que ela faz com o “ay” final do último verso (“Each day is Valentine’s Day”).

Ahmad Jamal

Ano: 1958
Álbum: At the Pershing vol. 2 (Argo)

A noite de 17 de Janeiro de 1958 no Pershing Hotel de Chicago produziu dois discos indispensáveis do trio do pianista Ahmad Jamal (com Israel Crosby e o baterista Vernel Fournier). A sua versão de “My Funny Valentine”, contida no vol. 2, converte a balada numa valsa elástica e realça a ironia e provocação que estão contidas na letra mas que quase todos os intérpretes ignoram.

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