Musica, Jazz, Ella Fitzgerald
©Billedbladet NÅ/P. RømmingElla Fitzgerald
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10 versões de “You Don’t Know What Love Is”

Uma canção que oferece uma visão trágica e fatalista do amor e se converteu num dos mais populares standards do jazz

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Custa a crer que Don Raye (letra) e Gene DePaul (música) tenham composto “You Don’t Know What Love Is” para Keep 'Em Flying (1941), uma desmiolada comédia aeronáutica da dupla Abbott & Costello, que funcionava também como apelo ao alistamento na Força Aérea americana (a II Guerra Mundial estava em curso, embora ainda sem a particpação directa dos EUA). É uma canção que oferece uma visão sombria do que é o amor: “Não sabes o que é o amor/ Até aprenderes o significado dos blues”, devendo aqui os “blues” entender-se no duplo significado do género musical e de uma disposição de espírito depressiva. No filme, a canção era interpretada por Carol Bruce, mas o trecho foi suprimido na montagem final. Ella Fitzgerald deu pela sua existência mas, estando em princípio de carreira, pouco ou nada conseguiu fazer para a difundir. A canção foi repescada para um musical de série B, Behind the Eight Ball (1942) – novamente uma comédia e mais uma vez cantada por Carol Bruce – mas permaneceu arredada dos holofotes até que em meados da década de 1950 Miles Davis e Chet Baker a gravaram e empurraram para a ribalta. “You Don’t Know What Love Is” é uma lição sobre a vida como perda e desilusão: “Até teres vivido uma paixão condenada à perda/ Não sabes o que é o amor// Não sabes como doem os lábios/ Até teres beijado e pagado o preço desse beijo/ Até teres jogado o teu coração e perdido/ Não sabes o que é o amor// Não sabes o que sente um coração perdido/ Quando é assaltado pelas recordações/ E como os lábios que provaram as lágrimas/ Perdem o gosto por beijar// Não sabes como os corações ardem/ Por um amor incapaz de medrar mas também não se extingue/ Até teres enfrentado cada madrugada com os olhos da insónia/ Não sabes o que é o amor”.

10 versões de “You Don’t Know What Love Is”

Ella Fitzgerald

Ano: 1941
Álbum: The Complete Decca Singles vol. 2: 1939-1941 (Decca)

As gravações de Ella Fitzgerald para a Decca, que cobrem o período entre 1935 e 1955 e foram feitas sobretudo no formato de singles de 78 rpm, são ofuscadas pela sucessão de álbuns geniais que gravou para a Verve a partir de 1955. Há porém muitas pérolas nas 150 canções dos anos Decca, embora Ella tivesse apenas 18 anos quando, em 1935, começou a gravar com a orquestra de Chick Webb. Quando Webb faleceu, em 1939, Ella, dando provas de grande determinação, assumiu a direcção da orquestra e passou a apresentar-se como “Ella & Her Famous Orchestra” – um passo surpreendente, no mundo de então, para uma rapariga negra de 22 anos. Foi neste período – a 28 de Outubro de 1941 – que gravou esta versão de “You Don’t Know What Love Is”, que desfaz cabalmente as acusações de que a alegria e vivacidade que Ella punha no acto de cantar faziam com que atraiçoasse as canções mais melancólicas. Dificilmente poderia imaginar-se uma interpretação mais sentida e pungente – quem canta assim conhece a fundo “the meaning of the blues”.

Miles Davis

Ano: 1954
Álbum: Walkin’ (Prestige)

Em 1954, Miles Davis estava a emergir de uma fase sombria da sua vida, em que andara arredado da linha da frente do jazz devido a problemas de toxicodependência. A gravação de “You Don’t Know What Love Is” foi realizada com o pouco conhecido David Schildkraut (saxofone) e uma secção rítmica de luxo formada por Horace Silver (piano), Percy Heath (contrabaixo) e Connie Kay (bateria). As gravações desta sessão de 29 de Abril, tal como as de 3 de Abril, com J.J. Johnson e Lucky Thompson no lugar de Schildkraut, só seriam editadas em 1957.

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Dinah Washington

Ano: 1955
Álbum: For Those in Love (EmArcy)

For Those in Love é um dos cumes da discografia de Dinah Washington. A exuberância inata da cantora e a sua queda para os maneirismos por vezes atraiçoam o espírito das canções – uma ocorrência mais frequente nos seus discos mais tardios – mas aqui tudo tem conta, peso e medida (a voz só se inflama no derradeiro verso) e Washington tem o apoio sempre judicioso e inspirado de um septeto de estrelas, com Clark Terry, Jimmy Cleveland, Paul Quinichette, Cecil Payne, Wynton Kelly, Barry Galbraith, Keeter Betts e Jimmy Cobb, arranjado por Quincy Jones – um talentoso e ainda pouco conhecido rapaz de 22 anos que mais tarde colocaria o seu talento ao serviço de desígnios puramente comerciais.

Sonny Rollins

Ano: 1956
Álbum: Saxophone Colossus (Prestige)

Em 1956, Sonny Rollins e John Coltrane destacavam-se entre as estrelas em ascensão do saxofone jazz e a crítica prognosticava-lhes grandes realizações. Coltrane iria não só confirmar como exceder as expectativas, mas Rollins não mais ultrapassaria o (excelente) nível dos seus discos de 1956-58 e Saxophone Colossus acabaria por ficar como o píncaro da sua carreira. Tem a vantagem de estar muito bem acompanhado por Tommy Flanagan (piano), Doug Watkins (contrabaixo) e Max Roach (bateria).

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Billie Holiday

Ano: 1958
Álbum: Lady in Satin (Columbia)

Em Fevereiro de 1958, quando Lady in Satin foi gravado, a voz e a saúde de Billie Holiday estavam em farrapos. A cantora só gravaria mais um álbum, em Março de 1959, quatro meses antes de falecer. Os últimos discos de Holiday são alvo de polémica: há quem entenda que nunca deveriam ter sido gravados, por deslustrarem as suas realizações anteriores, outros defendem que, embora a voz esteja em ruínas, a entrega emocional da cantora compensa as insuficiências vocais (é talvez uma discussão que passará ao lado de quem, no nosso tempo, se acostumou a cantores de jazz dotados de vozes aflitiva e irremediavelmente débeis).

Caberá ao ouvinte julgar se esta versão de “You Don’t Know What Love Is”, que conta com o suporte acetinado da orquestra de Ray Ellis, é penosa ou sublime.

Ahmad Jamal

Ano: 1958
Álbum: Portfolio of Ahmad Jamal (Argo)

Em 1958-59, o trio do pianista Ahmad Jamal, com Israel Crosby (contrabaixo) e Vernel Fournier (bateria), efectuou vários registos ao vivo memoráveis nos clubes Pershing, em Chicago, e Spotlight (também grafado como Spotlite), em Washington DC, que deram origem a uma confusa sucessão de álbuns com diversos títulos e combinações de peças, depois rearrumados em reedições na era digital. Portfolio of Ahmad Jamal, surgido em 1959, contém parte dos registos de 5 e 6 de Novembro no Spotlight e entre elas está este “You Don’t Know What Love Is”, em versão aérea, concisa e irónica, que nada conserva do dramatismo e desolação da canção original e mais parece obra de um trio de duendes traquinas.

As sessões no Spotlight estão disponíveis na íntegra em Complete Live at the Spotlite Club 1958, editado pela Gambit.

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Chris Connor

Ano: 1959
Álbum: Witchcraft (Atlantic)

Witchcraft é, como os restantes álbuns que Connor gravou para a Atlantic na segunda metade da década de 1950, uma peça indispensável numa discoteca de jazz vocal, mas esta versão da canção de Raye/DePaul revela algum conflito interior. Connor é fiel ao espírito da canção mas a parte orquestral, extrovertida e colorida, leva o ouvinte a interrogar-se sobre se Richard Wess, o arranjador e director da orquestra, se terá dado ao trabalho de ler a letra ou, pelo menos, de averiguar qual seria o seu teor geral. Quando um músico de jazz instrumental se apropria de um tema, pode submetê-lo a tratos de polé e descartar a atmosfera e carga emocional associada à letra – é o caso da desconstrução operada por Jamal no exemplo anterior – mas quando se acompanha um cantor há que zelar pela coerência.

Linda Lawson

Ano: 1960
Álbum: Introducing Linda Lawson (Chancellor)

Linda Lawson (n.1936) é bem mais conhecida como actriz de cinema e TV – Alfred Hitchcock Presents, The Alfred Hitchcock Hour, Maverick, Ben Casey – do que como cantora. Na verdade só gravou dois singles para a Verve (com arranjos e direcção de Henry Mancini) e um álbum, Introducing Linda Lawson, para a Chancellor (com arranjos e direcção de Marty Paich). É pena que a sua carreira discográfica tenha ficado pela “apresentação”, pois tem uma voz segura e o seu talento como actriz permite-lhe injectar a carga emocional adequada a cada canção. Para mais, em Introducing Linda Lawson conta com o respaldo de jazzmen de nomeada, como Art Pepper ou Jimmy Rowles.

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John Coltrane

Ano: 1962
Álbum: Ballads (Impulse!)

Ballads surge num curioso momento da carreira do quarteto de John Coltrane com McCoy Tyner, Jimmy Garrison e Elvin Jones. As suas primeiras gravações para a Impulse!, em 1961-62 já evidenciavam que as revoluções operadas no seu período Atlantic dariam lugar a explorações ainda mais radicais e que a sua rota apontava ao espaço sideral. Porém, ou por a editora não querer intimidar o público ou para o saxofonista tomar fôlego antes de partir em direcção às estrelas, 1963 foi o ano em que saíram três discos retrógrados e amáveis de Coltrane: Ballads e as parcerias com Duke Ellington e Johnny Hartman. Como o nome indica, Ballads é constituído exclusivamente por baladas clássicas, tocadas de forma intensa mas convencional.

Lennie Tristano

Ano: 1965
Álbum: Concert in Copenhagen (Jazz Records)

Lennie Tristano (1919-1978) era um pianista muito pouco convencional e a sua leitura de “You Don’t Know What Love Is” é de uma extraordinária liberdade e audácia. A discografia de Tristano é esparsa e este concerto a solo em Copenhaga a 31 de Outubro de 1965 só foi editado em 1998 – afortunadamente, foi também filmado, o que proporciona uma rara oportunidade de ver Tristano em acção nesta época.

Versão a versão enche a galinha o papo

  • Música
  • Jazz

“Summertime” é um objecto de difícil classificação. É uma ária de ópera – é ela que abre Porgy & Bess (1935) –, é uma canção de embalar – Clara canta-a para adormecer o seu bebé –, tem raízes nos espirituais negros e nos blues, um musicólogo viu nela influências de Dvorák, Wayne Shorter filia-a no “acorde de Tristão, de Wagner, e foi entusiasticamente adoptada pelo jazz – embora não tenha despertado grande interesse até ao final da II Guerra Mundial, nas décadas de 1950 e 1960 foram gravadas cerca de 400 versões por músicos de jazz.

A ópera tem libreto de DuBose Heyward, a partir de uma peça sua que adaptava o seu romance Porgy (1925), e a letra de “Summertime” inspirou-se na do espiritual negro “All My Trials”. No que toca à músca, há quem sugira que outro espiritual, “Sometimes I Feel Like a Motherless Child”, terá servido de inspiração a Gershwin.

  • Música
10 versões de “Night and Day”
10 versões de “Night and Day”

A canção faz parte do musical Gay Divorce, com música de Cole Porter e libreto de Dwight Taylor e um título que hoje poderia sugerir uma sátira ao casamento gay – porém, em 1932, quando o musical estreou, “gay” era apenas entendido no sentido de “alegre” e o casamento que se encaminha para um inevitável (e nada trágico) divórcio é heterossexual. Cole Porter teve de ajustar a melodia aos modestos recursos vocais de Fred Astaire, naquele que seria o seu último papel na Broadway, antes de rumar a Hollywood. Por coincidência, dois anos depois, Astaire reencontrar-se-ia com a canção, pois ele e Ginger Rogers foram as cabeças de cartaz da adaptação cinematográfica do musical, dirigida por Mark Sandrich. Na transferência para o ecrã, o título sofreu uma ligeira alteração (The Gay Divorcee) e as canções ficaram pelo caminho, sendo “Night and Day” a única sobrevivente.

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  • Música

Quem diria que uma canção tão melancólica proveio de um musical com o título Carnival in Flanders? A atmosfera não é de Terça-Feira Gorda mas de Quarta-Feira de Cinzas; o tema é a desilusão e a erosão do amor, algo que parece impossível quando se está apaixonado.

A canção, com música de Jimmy Van Heusen e letra de Johnny Burke, foi composta para o dito musical, baseado no filme Kermesse Héroïque (1934), de Jacques Feyder, uma comédia cuja acção decorre na Flandres em 1616. O musical, que enfrentou problemas na fase de produção, estreou-se na Broadway em 1953 e foi um fiasco de bilheteira. Só teve seis exibições, o que não impediu Dolores Gray de ganhar um Tony pela sua prestação. É à sua personagem que cabe cantar “Here's That Rainy Day” e foi esta a única canção do musical a conquistar popularidade – e, ainda assim, foi preciso esperar seis anos para que Frank Sinatra lhe desse um empurrão.

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