Anna Calvi
© Maisie Cousins
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Anna Calvi: “Estou farta de ver mulheres a serem caçadas”

Entrevista a Anna Calvi. A cantora britânica subverte ideias normativas de género no seu novo disco, "Hunter"

Luís Filipe Rodrigues
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O novo álbum da cantora britânica Anna Calvi, Hunter, é uma boa surpresa. O registo é assumidamente queer e aborda abertamente questões que, até agora, se encontravam apenas nas entrelinhas do seu trabalho, ou melhor, de algumas canções. É natural, por isso, que a nossa conversa sobre o disco e o concerto de sábado, no Capitólio, tenha sido dominada por essas questões de género. Tal como, segundo palavras da própria, “foi natural” que as mesmas questões dominassem o disco. 

O teu anterior álbum, One Breath, saiu há cinco anos. Porque demoraste tanto tempo a gravar o seu sucessor?

Desta vez quis fazer o disco com mais calma. Quis garantir que podia dar a cara por ele e sentir-me orgulhosa do que fiz, e por isso não isso não quis apressar o processo. Fazer a melhor música possível foi mais importante do que despachar-me a lançar um disco.

Já estavas a trabalhar nisto há três anos, quando disseste que não querias mostrar as canções que estavas a fazer ninguém porque tinhas medo de que as ideias dos outros afectassem a tua opinião. Como é que elas mudaram – se é que o fizeram – depois de as mostrares ao teu produtor e à banda?

Sou muito solitária quando trabalho. Depois, quando toco com a banda, as faixas ganham uma nova vida. Mudam de maneiras que eu não estava à espera, e é por isso que é tão entusiasmante tocar com outros músicos. Mas, como tinha maquetes muito detalhadas, o coração da canção manteve-se o mesmo.

Nessa entrevista de há três anos também se lia a dada altura que tu querias muito “discutir questões de género”, mas admitias que era algo em que não tinhas pensado durante muito tempo. O que mudou?

Tive fases na minha vida em que pensei mais ou ligeiramente menos sobre estes assuntos. Porém, sempre senti que a música me permitia ir além do género. Sempre senti uma presença muito masculina na minha música. Quis explorar essas questões.

A subversão dos papéis de género normativos é um tema transversal ao Hunter. Concordas?

Sim. O disco é sobre não teres de ser definido pelo teu género, e não teres de seguir um código restritivo que limita quem podes ser. Estou farta de ver as mulheres a serem caçadas, nos media e na nossa cultura, e por isso quis contar uma história de uma mulher que é a caçadora. Que olha para o mundo como algo que lhe pertence, sem vergonha.

Falaste em “ir além do género”, uma expressão que também usaste há uns meses, no texto de apresentação do disco, onde se lê que “não queres ter de escolher entre o que há de masculino e de feminino em ti”. Quão difícil é esse processo, para ti, tendo em conta as ideias heteronormativas e patriarcais entranhadas em quase todos nós?

Sempre senti que a música é a melhor maneira de expressar o que sinto em relação a isto. Até porque no meu dia-a-dia é difícil sentir-me tão livre como me sinto quando estou a tocar. Porém, posso dizer-te que estou rodeada por pessoas que me apoiam e vou tentando viver de uma forma que seja verdadeira e honesta em relação a quem sou.

Outra frase tua que me deu que pensar quando a li foi esta: “O rock’n’roll não está acabado – os rockers masculinos é que estão.” Acreditas mesmo nisso? A meu ver o rock continua a ser um meio dominado quase exclusivamente por homens.

Mas muita da música de guitarras mais interessante do momento é feita por mulheres. Ao longo dos séculos, a arte ocidental tem privilegiado uma perspectiva em detrimento de todas as outras, de todos nós, e acho que é altura de ouvirmos e prestarmos atenção a outros discursos.

Conversa cantada

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