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O amor de Silva por Lisboa

O músico brasileiro acaba de editar ‘Ao Vivo em Lisboa’ e falou connosco sobre o carinho com que o recebemos, há um ano, nos concertos do Capitólio.

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Quando Silva mergulhou na imensidão de material que tinha armazenado no computador, foi surpreendido pela gravação de um concerto em Lisboa. O músico brasileiro tem por hábito gravar as suas actuações ao vivo, mais para auxílio de memória do que por outra coisa. São recados ao esquecimento, registos pessoais de uma carreira que era para não o ser, tivesse ele insistido no violino, o instrumento de formação, e se se tivesse mantido na orquestra que integrou durante muitos anos. Mas naquele dia, naquele computador, naqueles registos, reencontrou o amor: num concerto no Cineteatro Capitólio, em Lisboa, que não havia esquecido mas que já não sabia conter tudo aquilo que ali estava.

“A gravação estava melhor do que as outras; pela acústica do Capitólio, o público estava caloroso. Fiquei emocionado quando ouvi. E Lisboa não é uma cidade qualquer, tenho um carinho gigante porque me tem recebido desde o começo”, diz. O Vodafone Mexefest, em 2013, foi o primeiro palco do brasileiro, agora com 31 anos, deste lado do Atlântico. A língua comum e a sedução da música envolveram o público, e a relação foi crescendo. Lisboa, para Silva, não são colinas e monumentos, luz e histórias, não são as calçadas. “São as pessoas certas que fazem os lugares ficarem incríveis”, acredita o músico.

Depois desse primeiro concerto, ficou por mais três meses. E aqui gravou aquele que seria o segundo disco, Vista Para o Mar. Não que seja um retrato; o privilégio da escrita fotográfica, diz, vive em Caetano Veloso, capaz de “passar pela rua, enxergar alguma coisa interessante e falar sobre isso”, mas há tanto de Caetano em Silva que o apetite nunca se afasta muito daquilo que o baiano faz. A suavidade de melodias, de voz, o swing que diz ter descoberto em palco. Ainda que isso lhe valha críticas. “Acharam que a minha música era leve de mais. Leve no sentido ingénuo. Eu gosto muito da frase ‘don’t take my kindness for weakness’. Nunca achei que fosse.” Partiu e abraçou sempre o futuro, mesmo debaixo de fogo, seguindo-se discos como Júpiter ou Brasileiro.

Mas a quarentena e o medo meteram-se pelo meio e paralisaram-lhe a música. “Pensei ‘cara, acabou minha carreira’”. Foi no irmão, Lucas, manager, co-compositor e “tradutor de sentimentos”, que encontrou uma nova via, pavimentada a mais de 30 canções. “Estou compondo bastante neste momento. A torneira ligou”, e com ela está para chegar um novo disco. “Queria colaborar com alguém de Portugal, alguém que batesse com o disco, estou pesquisando. Tem vários que eu gosto: amo o [António] Zambujo, acho ele muito chique. Adoro o Branko, acho-o um produtor incrível.”

Recuamos a Lisboa e ao concerto. “Era um show de voz e violão, com um bocadinho de percussão, mas fiquei muito emocionado porque comecei a tocar a ‘Carinhoso’, que é uma coisa bem saudosista, e senti o público muito respeitoso. Senti-me respeitado como músico, de um jeito que fiquei bem orgulhoso.” Acabou por decidir-se a editá-lo em disco: Ao Vivo em Lisboa foi lançado digitalmente, com o selo da Sony Music, a 22 de Maio. E, além do repertório de Silva, inclui vários covers: “Bem Que se Quis” e “Beija Eu” (Marisa Monte), “Um Girassol da Côr do Seu Cabelo” (Lô Borges), “Flôr do Cerrado” (Gal Costa).

É uma decisão consciente, de homenagem. É também uma terapia, como a música sempre foi. “É uma coisa divertida e acaba trazendo muitas possibilidades. Cantar Novos Baianos, por exemplo, sendo eu um cara tímido, foi uma grande ajuda. Esse processo de tocar Marisa, cantar Novos Baianos, Caetano, Tim Maia, foi importante para me tirar daquele lugar de timidez.”

A timidez e a permeabilidade são lutas constantes. Assim como a ansiedade. Mas sempre que a música de Silva nos chega é fácil tactear a força e a limpidez, como se todos os receios pudessem dissolver-se pelas estrofes. “Para mim, a música tem uma importância muito grande nesse ponto. Eu faço música primeiramente com o intuito de me acalmar. Sou um cara que parece calmo, tenho um jeito de falar calmo, mas sofro bastante com ansiedade; problemas para dormir, insónias horríveis. Acho que tudo o que te faz diminuir a ansiedade, inspirar, menos noiado com a vida, tem um valor grande e vai ter sempre. Não faço isso como estratégia, é uma coisa vital.”

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