Em contraste com a música clássica, em que a percussão costuma desempenhar um papel menor e há obras em que o percussionista passa meia hora imóvel e apenas intervém no “tcham-tcham” final, o jazz confiou, desde os seus primórdios um papel importante à bateria. Na era do swing, virtuosos como Gene Krupa e Buddy Rich deram à bateria um novo protagonismo e quando, na viragem das décadas de 1940-50, o bebop fez explodir a linguagem do jazz, havia bateristas como Max Roach e Art Blakey a liderar a revolução. Alguns dos mais excitantes grupos do nosso tempo têm bateristas à frente – e Portugal não é excepção.
Se Sísifo fosse hoje condenado pelos deuses a um penoso trabalho eternamente renovado, atribuir-lhe-iam o levantamento exaustivo da discografia de John Zorn. É frequente encontrar músicos de jazz que se desdobram por múltiplos projectos mas nenhum – nem mesmo Kan Vandermark ou Dave Douglas – rivalizam em produtividade e ecletismo com Zorn: os seus interesses vão do hardcore japonês à lounge music e a sua música vai do klezmer jazz, patente nas infinitas ramificações do projecto Masada, às bandas sonoras para filmes (reais e imaginados); da “música romântica” ao free thrash demencial dos Painkiller, passando pela escrita para quarteto de cordas, quartetos de guitarras eléctricas ou duos de guitarra acústica; pela improvisação sem rede, pelas colaborações com Mike Patton e Thurston Moore e – para desmentir quem o acusa de nada ter a ver com jazz – pelo quarteto dedicado à música de Sonny Clark, pelo quinteto dedicado à música de Ornette Coleman e pelo trio (News For Lulu) dedicado às composições de Kenny Dorham, Hank Mobley e Sonny Clark, pilares do hard bop da Blue Note na viragem das décadas de 1950-60.
Além da sua intensíssima actividade como músico, compositor, produtor, programador e instigador de projectos musicais, ainda dirige uma das mais prolíficas e surpreendentes editoras do mundo, a Tzadik, e fundou em 2005 em Nova Iorque um clube, The Stone, por onde têm passado numerosos nomes de referência das vanguardas musicais, ligadas ou não ao jazz. De 27 de Julho a 5 de Agosto, a Fundação Gulbenkian revela algumas das facetas de um criador que desafia classificações e a ideia de que o dia tem apenas 24 horas.
Além dos concertos, o Jazz em Agosto inclui a projecção de filmes na Sala Polivalente da Colecção Moderna, com entrada gratuita. São eles:
– John Zorn (2016-2018), de Mathieu Amalric: domingo 29, 18.00
– Pomegranate Seeds, com banda sonora em tempo real por Ikue Mori: terça-feira 31, 18.30
– Bhima Swarga, filme de Ikue Mori: quinta-feira 2, 17.00
– The Book of Heads: 35 Études for Solo Guitar Performed by James Moore, de Stephen Taylor: sexta-feira 3, 17.00
– Celestial Subway Lines/Salvaging the Noise, de Ken Jacobs: sábado 4, 17.00
– Between Science and Garbage, de Pierre Hébert: domingo 5, 17.00
A programação completa pode ser consultada aqui.