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© Nuno MartinsJúlio Resende
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13 pianistas de jazz portugueses que precisa de ouvir

O piano é tão versátil que desde cedo se tornou central no jazz. E Portugal está bem servido de bons pianistas de jazz

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Madeleine Albright, Secretária de Estado da administração Clinton, ficou célebre por ter denominado os EUA como a “nação indispensável”. Durante várias décadas, também o piano foi visto no meio jazzístico como “o instrumento indispensável”: a mão esquerda do pianista pode fazer de “secção rítmica” e a direita ocupar-se da melodia, e pronto, não são precisos mais instrumentos; já os outros instrumentos do jazz tiveram de esperar até à década de 1960 para que se tornasse aceitável que pudessem apresentar-se a solo. Por outro lado, foi preciso esperar quase tanto tempo – até ao início dos anos 50 – para que o saxofonista Gerry Mulligan ousasse apresentar-se regularmente com formações que dispensavam o piano.

Nos nossos dias, o piano já não é “indispensável”, mas continua a estar na primeira linha e é mais frequente que seja o pianista o compositor e o líder de um combo de jazz do que outro instrumentista.

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13 pianistas de jazz portugueses que precisa de ouvir

1. Mário Laginha

O longo curriculum de Mário Laginha (n. 1960) inclui uma prolífica e variada parceria com Maria João (em duo, em quarteto, com orquestra sinfónica...), o trio com Bernardo Moreira e Alexandre Frazão, o Novo Trio, com Moreira e a guitarra portuguesa de Miguel Amaral, várias colaborações com o saxofonista britânico Julian Argüelles (cujo fruto mais recente é o CD Setembro, de 2017) e o piano solo, que pode ser ouvido em Canções & Fugas, de 2006.

Laginha está pouco preocupado com ideais de pureza, pelo que é frequente encontrá-lo na terra-de-ninguém, como acontece em Mongrel, disco que reexamina o legado de Chopin por um prisma jazzístico, ou com o seu duo com Pedro Burmester (em tempos alargado a trio pela parceria com Bernardo Sassetti), ou nas suas composições para formações orquestrais “clássicas” (uma produção que inclui um concerto para piano e outro para clarinete).

[A Valsa op.34 n.º 2, de Chopin, ganha um travo jazzístico e uma melancolia de bossa nova na versão do Mário Laginha Trio, com Bernardo Moreira (contrabaixo) e Alexandre Frazão (bateria), ao vivo no Hot Clube, Lisboa, 23.12.17]

2. João Paulo Esteves da Silva

João Paulo Esteves da Silva (n. 1961) tem desempenhado papel decisivo como arranjador e/ou pianista em obras fulcrais da música portuguesa (Sérgio Godinho, Vitorino, José Mário Branco, Fausto) e possui variada discografia em nome próprio, repartida entre o duo com o trompetista norte-americano Dennis Gonzalez, o trio com Peter Epstein e Carlos Bica, o trio No Project ou a colaboração com a Orquestra de Jazz de Matosinhos. O seu opus mais recente é Brightbird (2017), em trio com o contrabaixista Mário Franco e o baterista suíço Samuel Rohrer, preenchido com música depurada, aérea e lírica, daquela que qualquer aragem faz levitar. Na sua discografia contam-se também dois excelentes registos de piano solo, Memórias de Quem e White Works, o primeiro com influências de música sefardita, o segundo dedicado a composições do contrabaixista Carlos Bica, que tem sido seu cúmplice em diversos projectos.

[Excerto do álbum Brightbird]

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3. Bernardo Sassetti

Abandonou-nos prematuramente em 2012, mas não pode falar-se do piano jazz em Portugal sem falar de Bernardo Sassetti (n. 1970). Jazz, música erudita, música para cinema e teatro, música popular, música para lá de definições e preconceitos – Sassetti espalhou o seu talento sem olhar a demarcações territoriais, guiado pelo modesto propósito de “tentar surpreender-me a mim mesmo”. Entre as suas múltiplas actividades, que incluem parcerias com Carlos do Carmo e Beatriz Batarda, reinvenções de canções de José Afonso com Mário Laginha, bandas sonoras para os filmes Alice, Um Amor de Perdição e O Talentoso Mrs. Ripley e um trio de pianos com Laginha e Pedro Burmester, o disco de piano solo Indigo e os três discos em trio com Carlos Barretto e Alexandre Frazão (Nocturno, Ascent e Motion) ficarão como sublimes testemunhos de um músico de génio.

[“Da Noite ao Silêncio”, do álbum Ascent (2005), com Barretto, Frazão e Jean-François Lezé (violoncelo)]

4. Paula Sousa

Além de carreira na pop (fez parte dos Repórter Estrábico e dos Três Tristes Tigres), tem dois discos de jazz em seu nome, Valsa para a Terri e Nirvanix, e fez parte do Tríotono e do Quarteto Cine Qua Non, com João Paulo (em acordeão), Afonso Pais e Mário Franco. Surge frequentemente em duo com cantoras de jazz, entre as quais Rita Maria, Bárbara Lagido, Sofia Vitória e Beatriz Portugal.

[“Valsa para a Terri”, por Paula Sousa. A dedicatária não será, provavelmente, capaz de apreciar inteiramente a homenagem, pois é uma cadela]

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5. Rodrigo Pinheiro

A vocação de Rodrigo Pinheiro (n. 1973) é a improvisação livre, o que explica que se desdobre por múltiplas formações, que, por vezes, só duram o tempo de um concerto ou de uma sessão de estúdio para registar um disco.

Os projectos mais duradouros de Pinheiro têm sido os Earnear, os Clocks & Clouds e, sobretudo, o RED Trio, com Hernâni Faustino (contrabaixo) e Gabriel Ferrandini (bateria), que, embora apresentando uma formação instrumental “clássica”, rompe os moldes tradicionais e pratica um jazz muito livre. O RED Trio é uma das formações portuguesas de maior projecção internacional, tendo gravado com o saxofonista John Butcher (Empire e Summer Skyshift), com o trompetista Nate Wooley (Stem) e o vibrafonista Mattias Stahl (North and the Red Stream), títulos que se somam a RED Trio, Rebento, Mineral, e Live in Munich, em trio propriamente dito.

Na discografia mais recente de Pinheiro surgiram, só em 2019, Live in Moscow, pelo Nau Quartet (de José Lencastre), White Bricks and the Wooden, em trio com Biliana Voutchkova e Ernestro Rodrigues, Rhetorica, em parceria com o Lisbon String Trio, Parallel Realities (do projecto homónimo de João Lencastre), Rayon Blanc, do colectivo Suspensão, e Wschód, em trio com Zbigniew Kozera e Kuba Suchar.

[O RED Trio ao vivo em Moscovo, 19.05.14]

6. Ruben Alves

Ruben Alves (n. 1976) tem uma carreira hiperactiva e ecléctica, com colaborações que abrangem algumas das vozes mais conhecidas da música portuguesa – Fausto, Mariza, Carminho, Cuca Roseta, João Gil, Rui Veloso –, o guitarrista Ricardo Rocha e o percussionista Pedro Carneiro. A sua experiência na música para teatro e no acompanhamento ao vivo de filmes mudos não será alheia à preciosa gestão da tensão dramática evidente na sua música.

Em Súbito (2008), álbum de piano solo, envereda por improvisações de sabor neo-clássico e ambiental, na linha de Roger Eno e Mompou. No trio Kolme (que lançou dois discos homónimos, em 2012 e 2017), com Miguel Amado (contrabaixo) e Carlos Miguel (bateria), cruza melodias límpidas, grooves inspirados em pop, rock e hip-hop e crescendos épicos feitos da repetição de motivos simples (e é também capaz de reconstruir de alto a baixo a canção “Construção”, de Chico Buarque).

O seu disco mais recente, Lúmen (2018), é uma recriação, em piano solo, de hinos religiosos.

[“Pulguita”, do álbum Kolme (2012)]

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7. Filipe Melo

Após uma carreira precoce como hacker, interrompida abruptamente aos 15 anos, quando foi detido por pirataria informática, Filipe Melo (n.1977) descobriu no teclado do piano um escape para a sua criatividade e irrequietude mais produtivo do que o teclado do computador. Estudou no Hot Clube e no Berklee College of Music de Boston e tem tocado com vários nomes lendários do jazz. Mas o facto de ter deixado para trás a pirataria informática não quer dizer que se tenha tornado num bem comportado e previsível capitão da marinha mercante musical: em jeito de corsário ou flibusteiro, tem colaborado com músicos tão variados quanto The Legendary Tiger Man, Camané, GNR, Sérgio Godinho, Carlos do Carmo ou Ana Bacalhau, na qualidade de arranjador, director musical ou pianista. Ainda assim, todas estas actividades não são suficientes para dar vazão às ideias que lhe fervilham na mente, pelo que também se tem distinguido como argumentista de banda desenhada (em parceria com Juan Cavia) e como guionista e realizador de cinema – nestas vertentes é de realçar a curta-metragem Sleepwalk (2018), a partir da BD homónima de sua autoria.

[“Debut”, faixa de abertura do álbum com o mesmo título (2006, Clean Feed), com Bruno Santos (guitarra) e Bernardo Moreira (contrabaixo)]

8. Pedro Neves

Pedro Neves (n. 1978) esperou até aos 35 anos para lançar o seu primeiro disco na qualidade de líder – em trio com Miguel Ângelo (contrabaixo) e Leandro Leonet – mas a demora foi justificada, pois poucas obras de estreia têm a maturidade e perfeição de Ausente (2013). Embora o opus 2, 05:21 (2016), não tenha sido tão bem sucedido, o trio de Neves regressou ao nível estratosférico com Murmuration (2019), um dos melhores discos de jazz português do ano transacto. Além da liderança deste trio, Neves colabora com os grupos de Bruno Macedo, Lucia Martínez e Mariana Vergueiro.

[“Presente”, do álbum Ausente, pelo Pedro Neves Trio, ao vivo, 2014]

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9. Filipe Raposo

O trajecto de Filipe Raposo (n. 1979) tem ignorado as fronteiras entre géneros musicais: formação clássica, arranjador e acompanhador de José Mário Branco, Fausto, Sérgio Godinho, Amélia Muge, Janita Salomé e Vitorino, acompanhamento de filmes na Cinemateca Portuguesa, membro da Tora Tora Big Band. Estreou-se em nome próprio com o excelente First Falls (2012), em trio com contrabaixo/baixo e bateria, a que se seguiu A Hundred Silent Ways (2013), em piano solo e onde a música tradicional de Miranda do Douro e Idanha-A-Nova convive com Bach e ecos de fado e música sefardita. Após dois anos em Estocolmo, onde estudou no Real Colégio de Música, associou-se a um muito jovem trio sueco, com o qual gravou Inquietude (2016). Mantém duos com o pianista Filipe Melo, com a cantora Rita Maria (com quem gravou Live in Oslo) e com o desenhador António Jorge Gonçalves.

O seu disco mais recente é Ocre (2019), o vol.1 da Trilogia das Cores, que combina texto e música (em piano solo) num livro-CD – anunciam-se para breve os volumes Vermelho e Preto.

[“First Falls”, do álbum homónimo, pelo trio de Filipe Raposo, com Yuri Daniel (baixo) e Vicky Marques (bateria), ao vivo na Culturgest, 14.01.12]

10. Luís Figueiredo

Luís Figueiredo (n. 1979) desdobra-se por vários géneros musicais. Tem discos em nome próprio – Manhã, Lado B e Kronos/Penélope, um duplo álbum saído no final de 2017 – e em parceria com o contrabaixista João Hasselberg (de quem é colaborador regular) – os muito recomendáveis, SongBird vol.1 e vol. 2 – e com a cantora Sofia Vitória – Palavra de Mulher. De natureza bem diferente é Canções Pagãs, um disco com o cantor Nuno Dias (de formação clássica), consagrado a canções de Luiz Goes, um dos nomes cimeiros da canção de Coimbra.

Figueiredo tem também contribuído como arranjador, director musical e instrumentista para as carreiras de muitos nomes da música portuguesa, como Cristina Branco, Ana Bacalhau ou Luísa Sobral e é de sua lavra o arranjo de uma canção que certamente todos os portugueses já ouviram, mesmo que contra vontade: “Amar pelos Dois”. O seu disco mais recente é Círculo (2019), em trio com Rita Maria (voz) e Mário Franco (baixo e contrabaixo).

[“O Elixir da Eterna Juventude”, canção de Sérgio Godinho, rejuvenescida pelo duo SongBird – Luís Figueiredo & João Hasselberg]

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11. Óscar Marcelino da Graça

Óscar Marcelino da Graça (n. 1980) é um dos mais requisitados pianistas do jazz nacional, tendo colaborado nos grupos de Nelson Cascais, Nuno Costa, André Carvalho, Paula Oliveira e Mariana Norton e integrado os colectivos Cumulus Nimbus, Hector, Loft e The Last Minute Experience. Estreou-se como líder com Velox Pondera (2012), em trio com Demian Cabaud (contrabaixo) e Marcos Cavaleiro (bateria).

As suas fontes de inspiração não se circunscrevem ao jazz, como pode atestar-se pelo vídeo abaixo e por liderar The John Eltons, um trio com José Almeida (contrabaixo) e André Silva (bateria) que recria canções de Elton John.

[Inspirada recriação de “Everlong”, dos Foo Fighters, no piano solo, por Óscar Marcelino da Graça, ao vivo no Hot Clube, Lisboa, 01.03.18]

12. Júlio Resende

O público não-jazzístico conhecerá provavelmente Júlio Resende (n. 1982) como músico associado a Salvador Sobral, quer na sua faceta mais jazzística (de que dá testemunho o álbum Excuse Me) quer na sua faceta mais pop-rock, com o projecto Alexander Search (com composições de Resende), ou através das suas recriações de clássicos do fado em piano solo (Amália por Júlio Resende, de 2013, e Fado and Further, de 2017) ou ainda pelas parcerias do pianista com Aldina Duarte, António Zambujo, Ana Moura, Cristina Branco, Cuca Roseta ou Marco Rodrigues.

Mas há uma faceta de Resende menos conhecida do grande público: a que gravou os álbuns Da Alma (2007), Assim Falava Jazzatustra (2009) e You Taste Like a Song (2011), uma sequência que se inicia em território inequivocamente jazzístico mas que vai revelando o apetite musical católico de Resende (que inclui hip-hop e kuduro) e o seu talento para se apropriar de canções de gente tão diversa quanto Radiohead, Pink Floyd ou John Mayer. O progressivo desvio em relação à ortodoxia culminou no surpreendente híbrido jazz/pop/electrónica que é Cinderella Cyborg (2018), que o pianista descreve como uma fusão de “carne e chips”.

Ainda mais fora do âmbito do jazz fica Poesia Homónima, um álbum em que o piano se alia à voz de Júlio Machado Vaz lendo poemas de Eugénio de Andrade e Gonçalo M. Tavares.

[“You Taste Like a Song”, do álbum homónimo, pelo trio de Júlio Resende, com João Custódio (contrabaixo) e Joel Silva (bateria), ao vivo na Fábrica Braço de Prata, 2012]

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13. Daniel Bernardes

Daniel Bernardes (n. 1986) tem os interesses eclécticos e o percurso sem respeito por fronteiras típicos dos jazzmen da nova geração: estudos de piano clássico, cursos de composição com Stockhausen e Emmanuel Nunes, colaborações regulares com músicos de jazz, formação de duo piano + vibrafone dedicado à reinterpretação de Radiohead, recriação da música de José Afonso e Carlos Paredes em piano solo, concerto multimédia a partir das recolhas de música tradicional de Michel Giacometti.

Este eclectismo convergiu em Nascem da Terra (2013), disco em trio com o contrabaixista António Quintino e o baterista Joel Silva (mais o colorido pontual do violoncelo de Raquel Merrelho) e feito de melodias límpidas e cuidadosamente torneadas e dominado por uma atmosfera solene e elegíaca.

As promessas contidas neste álbum não deixavam adivinhar o aparecimento em 2019 do audacioso Liturgy of the birds: In memoriam Olivier Messiaen (Clean Feed). O programa deste não contém composições de Messiaen, mas as harmonias de colorido exótico, os ritmos intrincados e subtis, a abertura a tradições musicais extra-ocidentais e a inspiração ornitológica típicas do compositor francês permeiam a música criada por Bernardes, com o contrabaixo de António Augusto Aguiar, a bateria de Mário Costa e o quarteto de percussão Drumming GP.

[“Bolero”, do álbum Liturgy of the birds: In memoriam Olivier Messiaen]

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