Bertrand Chamayou
©Marco BorggreveBertrand Chamayou
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Nove concertos de Mozart que precisa de ouvir

Bertrand Chamayou traz-nos o Concerto para piano n.º 22 de Mozart, uma das muitas obras-primas em que Mozart colocou um solista em diálogo com a orquestra.

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Wolfgang Amadeus Mozart legou-nos abundante produção para solista e orquestra, antes de mais para o seu instrumento de eleição, o piano, para o qual compôs 27 concertos (um deles para dois pianos e outo para três), a maior parte destinados a servir de “veículo” ao seu vistuosismo no instrumento. A sua fama como pianista tem mantido na sombra as suas qualidades como violinista, mas não faltam, porém, indícios de que terá sido, na juventude, um excelente executante do instrumento de corda. É verdade que teve o privilégio de ter como professor, desde os seis anos de idade, o seu pai, Leopold Mozart, um dos grandes mestres do instrumento no mundo austro-germânico de então.

Mas a criatividade de Mozart foi também posta ao serviço de instrumentos que não tocava, como o clarinete, a trompa, o oboé ou o fagote, ou com os quais embirrava, como a flauta.

Mozart por Bertrand Chamayou

Fundação Gulbenkian. qui 26 de Setembro 21.30. 12-24€

Nove concertos de Mozart que precisa de ouvir

1. Concerto para fagote K.191

Ano: 1774

Mozart tinha 18 anos quando compôs este concerto, possivelmente por encomenda de Thaddäus Freiherr von Dürnitz, um nobre que tocava fagote como hobby e para quem compôs no ano seguinte mais três concertos que se perderam. A parte solista requer um executante com desenvoltura, mas não põe exigências extraordinárias.

[I andamento (Allegro), por Voltan Agli (fagote) e Orquestra do Teatro Olimpico di Vicenza, com direcção de Giovanni Battista Rigon, no Teatro Olimpico di Vicenza, 2004]

2. Concerto para violino n.º 5 K.219

Ano: 1775

O pai de Mozart, Leopold era não só um grande violinista, como um reputado pedagogo, autor do Tratado sobre os fundamentos da técnica do violino (Versuch einer Gründlichen Violinschule), publicado no ano do nascimento de Wolfgang e que se converteu numa obra de referência para os estudantes de violino de então. A conjugação de um professor deste gabarito e o talento inato de Wolfgang poderiam tê-lo convertido num virtuoso do instrumento – é o próprio Leopold que o afirma , num trecho de uma carta enviada a Wolfgang: “Não tendes consciência de quão bem tocais o violino [...] Quando o fazeis com energia e empenhando o coração e a alma, sois o violinista n.º 1 de toda a Europa”. E Sendo Leopold exigente e rigoroso, quer como pai, quer como pedagogo, não é provável que exista exagero suscitado pelo amor paternal neste.

Foi como violinista que Mozart trabalhou na orquestra da corte de Salzburgo, até que o detestável Arcebispo Hieronymus Colloredo o despediu, em 1781. Talvez por associar o violino aos anos sob o jugo de Colloredo, Mozart não voltou a tocar o instrumento nem a compor para ele como solista. Os seus cinco concertos para violino foram compostos em 1775 (com provável excepção do n.º 1, para o qual se aventa a data de 1773). O n.º 5, terminado a 20 de Dezembro de 1775, é o mais elaborado e extenso dos cinco – e também o mais tocado.

[II andamento (Adagio), por Gidon Kremer (violino) e a Filarmónica de Viena, com direcção de Nikolaus Harnoncourt]

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3. Concerto para flauta n.º 1 K.313

Ano: 1778

Se a relação de Mozart com o violino foi ambígua, já quanto à flauta, exprimiu claramente o seu desagrado pelo instrumento numa carta ao pai de 14 de Fevereiro de 1778. Mozart recebera do flautista holandês Ferdinand de Jean a encomenda de três concertos para flauta, mas apenas compôs um na íntegra (o K.313), sendo o outro (K.314) uma mera adaptação do concerto para oboé K.271 (ver 10 concertos para oboé que precisa de ouvir) e nunca tendo trabalhado no terceiro – na dita carta ao pai, Wolfgang apresenta várias desculpas para o incumprimento do acordado, uma das quais é que “como sabeis, o meu espírito rapidamente fica entorpecido quando tenho de compor para um instrumento que não suporto”.

[I andmento (Allegro maestoso), por Emmanuel Pahud e Haydn Ensemble Berlin, com direcção de Hansjörg Schellenberger, no Mozarteum de Salzburgo, 2000]

4. Concerto para flauta e harpa K.299

Ano: 1778

O jovem Wolfgang andou durante parte da juventude em viagem pela Europa, primeiro como criança-prodígio, depois em busca de um cargo e de encomendas à altura das suas qualidades. Em 1778 passou sete meses em Paris, na companhia da mãe, e entre os alunos que tomou a seu cargo nesse período esteve a jovem harpista Marie-Louise Philippe, filha do duque de Guînes. Sendo este um flautista amador (muito dotado, na avaliação de Mozart), encomendou ao compositor um concerto para tocar com a filha – assim se explica a insólita combinação de solistas, que nenhum outro compositor de primeira grandeza ensaiou.

[I andamento (Allegro), por Lisa Beznosiuk (flauta), Francis Kelly (harpa) e Academy of Ancient Music, com direcção de Christopher Hogwood, em instrumentos de época (L’Oiseau-Lyre/Decca)]

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5. Concerto para piano n.º 20 K.466

Ano: 1785

Fevereiro de 1785 assistiu à composição, com escassos dias de intervalo, de duas obras-primas: os Concertos para piano n.º 20 K.466 e n.º 21 K.467. O pai de Mozart, Leopold, chegou a Viena, em visita, vindo de de Salzburg, a 14 de Fevereiro de 1785, data da estreia do K.466 e relatou, em carta a Nannerl, irmã de Mozart, a apresentação, com Mozart como solista (e maestro, como era uso na época), “de um excelente concerto para piano”, elogio que tem tanto maior valor quando se sabe que Leopold era homem austero e de palavras bem medidas. A composição fora terminada poucas horas antes da estreia e Mozart nem teve tempo de ensaiá-la, pois teve de supervisionar e rever a cópia das partituras para a a orquestra.

[II andamento (Romanze), por Friedrich Gulda (piano e direcção) e a Orquestra Filarmónica de Munique]

6. Concerto para piano n.º 22 K.482

Ano: 1785

O K.482 foi composto e estreado em Dezembro de 1785, na altura em que Mozart trabalhava em Le Nozze di Figaro. Como a publicação, em Setembro, da série de quartetos de cordas dedicados a Haydn não atraíra compradores, Mozart viu-se forçado a organizar três concertos por subscrição, a fim de equilibrar as suas sempre periclitantes finanças. O K.482 foi composto para esses concertos.

[III andamento (Allegro), por David Fray e Orquestra Sinfónica do Estado de São Paulo, com direcção de Marin Alsop, ao vivo em 2011]

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7. Concerto para piano n.º 25 K.503

Ano: 1786

1786 foi um ano de extraordinária produtividade, mesmo para os padrões de Mozart: terminou a ópera Le Nozze di Figaro, reviu a ópera Idomeneo, despachou a ópera cómica em um acto Der Schauspieldirektor e compôs uma sinfonia e três concertos para piano geniais. Entre estes últimos está o n.º 25 K.503, terminado a 4 de Dezembro, em Viena, quase ao mesmo tempo que a Sinfonia n.º 39 Praga K.504. Ambas as obras se destinavam a Praga, onde a popularidade de Mozart estava em alta, contrastando com o declínio do apreço pelo compositor em Viena. As duas obras têm a particularidade de não incluir clarinetes, talvez por Mozart não estar certo de a orquestra de Praga dispor de tais instrumentos. Não é a falta de clarinetes que retira brilho ao concerto, que é dos mais afirmativos e exuberantes do compositor.

[Por Paul Lewis (piano) e a Mahler Chamber Orchestra, com direcção de Daniel Harding, nos Proms de 2013, no Royal Albert Hall, em Londres)]

8. Concerto para trompa n.º 1 K.412 + 514

Ano: 1791

Os quatro concertos para trompa compostos por Mozart tiveram como destinatário o seu amigo Joseph Leutgeb, um trompista virtuoso. Mozart semeou a partitura de desafios ao solista, acompanhados de comentários trocistas, piadas e incitamentos, que atestam a proximidade entre eles e o espírito zombeteiro de Mozart.

O n.º 1 foi o último dos quatro a ser composto e compõe-se apenas de dois andamentos, não sendo certo que tenham sido concebidos originalmente para fazer parte do mesmo concerto. Há indícios de que o II andamento terá sido completado por Franz Xaver Süssmayr, assistente de Mozart, após a morte deste – o catálogo Koechel atribui mesmo números separados aos andamentos (K.412 e K.514).

[Por Teunis van der Zwart (trompa) e a Orquestra Barroca de Freiburg, com direcção de Petra Müllejans, em instrumentos de época (Harmonia Mundi)]

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9. Concerto para clarinete K.622

Ano: 1791

1791 foi outro “ano prodigioso” na carreira de Mozart, que viu surgir o Concerto para piano n.º 27, o Quinteto de cordas K 608, o moteto Ave Verum Corpus K.618, as óperas La Clemenza di Tito e A Flauta Mágica, o Requiem (inacabado) e o Concerto para clarinete. Este último foi composto para Anton Stadler, um clarinetista virtuoso, que Mozart conhecia (pelo menos) desde 1784 e era, como ele, membro de uma loja maçónica (e que foi seu parceiro em muitas noites de farra e jogatana). Stadler também tocava corno di bassetto, um instrumento da família do clarinete, de tonalidade mais grave e timbre mais escuro e é possível que o concerto tenha sido destinado originalmente a este instrumento – é difícil apurá-lo, pois a partitura original do concerto perdeu-se.

[II andamento (Adagio), por Sabine Meyer (clarinete) e Orquestra Filarmónica de Berlim, com direcção de Claudio Abbado]

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Desde Mozart até aos nossos dias, o concerto para piano é um dos géneros mais apreciados, ao equilibrar a imponência e colorido orquestral com o brilho e virtuosismo do solista, e muitos foram os compositores que nele investiram a sua melhor inspiração.

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