Há take-aways em Lisboa que, momentaneamente, nos podem levar até longe, mesmo que seja só por 45 minutos. Esta semana, por exemplo, quando dei por mim estava no vale de Bekáa, na região montanhosa de Zahlé, Líbano, chinelo no dedo e um calor bom para refrescar com tabbouleh.
Alejandro Chávarro é um jovem adulto facilmente reconhecível, sempre de lenço ao pescoço, como um dealer de arte com a sala cheia de gatos e um piano de cauda. Natural da Colômbia, fez carreira em salas parisienses e brilhou no L’Astrance, de Pascal Barbot, um três estrelas Michelin progressista. Desde 2017 que espalhava a palavra de pequenos produtores de vinhos franceses em restaurantes e lojas da especialidade de Lisboa, através da sua empresa Vinhos Livres.
Em 2020 voltou às salas, mas driblou as expectativas. Em vez de se instalar num dos grandalhões do fine dining de Lisboa, Chávarro tornou-se co-proprietário deste pequeno restaurante de base vegetariana, na zona de Santos, antes propriedade exclusiva do chef brasileiro João Ricardo Alves.
Isto importa por causa do futuro. Com Chávarro, estará o Arkhe a aproximar-se do cone de aspiração do guia francês?
Reza a história que a mudança para Portugal do chefe de sala e sommelier ocorreu como num desses filmes de amor de Hollywood. Há quatro anos, foi fazer um retiro de yoga para a Índia e aí se apaixonou por uma portuguesa. Desviado para Lisboa, rapidamente foi acolhido pela comunidade local de naturebas (aficionados de vinhos naturais), em franco crescimento, mas nunca se deixou ficar agrilhoado em facções.
Em Junho de 2019, na minha primeira visita ao Arkhe, comi muito bem. Comi como raramente havia comido num restaurante vegetariano em Portugal – acabando mesmo por indicar que alguns dos pratos já tinham pinta Michelin.
Ora, o que agora se provou foi a versão take-away, notoriamente diversa da experiência em sala. Mas mesmo assim talvez já se note a preocupação em solidificar os molhos (os “inspectores” têm horror a molhos fluídos) e em garantir formas geométricas e traços limpos.
Esta estética foi particularmente notória na terrine de cogumelos, um dos pratos muito presentes numa carta que vai mudando todas as semanas. Mas também nos dumplings, perfeitos na costura, ou nos gnocchi, com um jus de alho negro poderoso, que parecia ter sido reduzido de ossadas de dinossauro – outro clássico Arkhe.
De resto, todo o empacotamento do delivery tende para a sofisticação. A comida chega a casa com transporte próprio e é entregue numa enorme caixa personalizada, com várias outras caixas lá dentro, quase tudo reciclável.
A primeira coisa que espanta é a quantidade de comida. A indicação do menu grande é que serve duas pessoas, mas na verdade alimenta três. A segunda coisa que espanta é a quantidade de caixinhas com purés e molhos e maioneses e manteigas. Há manteigas para a focaccia, há molho de amêndoa e maionese de rábano, há purés de pastinaca e de topinambour.
E há instruções, claro. Sem espanto, estamos perante take-away para finalizar em casa.
Duas notas menos boas: faltou textura a este menu, faltou por exemplo crocância (frutos secos), e faltou arriscar nos sabores. Às tantas, parecia comida para bebé sem dentes.
Em síntese. Não sei se a Michelin está a avaliar entregas em casa. O que me parece evidente é que não desgostaria, já, do take-away deste Arkhe. E que quando o restaurante abrir haverá ainda mais motivos de regozijo. Para já, brilha a cozinha saborosa de João Ricardo Alves. Alejandro Chávarro ainda estará para mostrar tudo o que pode.
Menu publicado semanalmente no instagram e no site do Arkhe. Encomendas a partir do email reservas@arkhe.pt. Preço: menu individual (30€), menu para duas pessoas (64€). Entrega própria, 5€.
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