Dia 1
O relógio marca as 10.15 e na recepção do Altis Belém Hotel & Spa conversa-se em inglês, francês e português. O chef João Rodrigues, sem a habitual jaleca, mas fardado com roupa de campo – um oleado e umas botas Timberland –distribui o pequeno grupo por dois carros e avisa: “vamos, já estamos atrasados”. Com ele seguem August Lill, chef sueco com carreira feita em França, a namorada Jessica, parisiense, formada em pastelaria, e Ruben Trindade Santos, cozinheiro português que trabalhou no Feitoria; no carro atrás seguem jornalistas e António Gonçalves, responsável pela Pousada de São Bartolomeu em Bragança, também com escola feita no Feitoria.
Primeira paragem: Mercado do Livramento - Mercado Municipal de Setúbal (Av. Luísa Todi, 163. 265 545 392. Ter-Dom 07.00-14.00). Quem recebe o grupo é Luís Barradas, setubalense de gema, com passagens pelo Sea Me, o Tago’s e agora à frente de uma nova morada na terra que o viu nascer, o Zagaia, com marisco, sushi e pratos tradicionais de peixe. Conhece como ninguém o mercado onde se abastece – é aqui que toma o pequeno-almoço diariamente, composto por uma uma bifana e uma mini, na Casa das Bifanas do Ramiro e da Celisa – e é ele que vai explicando, banca a banca, peixe a peixe, como se cozinha cada um dos exemplares. “Aprendi com o Ángel Léon [restaurante Aponiente, Porto de Santa Maria], a cozinhar as bochechas deste peixe como se fossem carne de pombo”, conta, enquanto aponta para uma xaputa. “Nos salmonetes, costumamos tirar o fígado e fazer um molho”, explica, a August Lill em particular, mas a todos em geral. Afinal, é este o chef convidado para o terceiro jantar Matéria. João Rodrigues explica o projecto.
“Trata-se de conhecer pessoas: nós, os que transformamos, e os que produzem. É isso que está na base do Matéria. Um chef internacional, um chef local de uma região, uma região e um produtor de vinhos dessa região. O Matéria nasceu há um ano e meio como um menu do restaurante. Ao fim de um tempo de fazer uma reflexão e de fazer um percurso já grande no Feitoria, comecei a analisar bem tudo o que se passava em termos de redes sociais e reacções dos clientes. E percebi que as pessoas têm uma reacção sempre efusiva ao produto, muito mais do que a pratos, chefs, seja o que for. O que quer dizer que vibram quando vêem bom produto. Mas as pessoas estão cada vez mais distantes disto que temos aqui à nossa volta [campo]. Deixámos de conhecer quem trata das cabras, quem plantou os legumes, quem fez o vinho. Portanto, achei que tinha de ter um menu com uma dinâmica boa de trazer - já que não podemos pegar nas pessoas e fazer isto que estamos a fazer, de as levar aos produtores - trazer os produtos até aos clientes e explicar um bocadinho de onde é que ele veio, porquê, quem é que o traz, qual é o produtor.”