Dino D'Santiago
Fotografia: Gabriell VieiraDino D'Santiago
Fotografia: Gabriell Vieira

A Lisboa negra de Dino D'Santiago

Música para dançar até de manhã, comida para aconchegar em qualquer altura, marcas inovadoras e projectos sociais. Há uma Lisboa a acontecer pelas mãos de pessoas negras que toda a gente deveria conhecer.

Cláudia Lima Carvalho
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Dino D’Santiago canta “Nova Lisboa”, mas sabe que não é tão nova assim. Novo talvez seja o olhar que nos conseguiu pôr nos olhos. “Infelizmente, ainda há muito preconceito”, diz. Mas a nova geração é mais desprendida e assume que “somos todos crioulos e vamos começar uma nova narrativa”. E essa narrativa começa nas periferias de Lisboa, onde está “a diversidade toda”. “É engraçado”, continua Dino, que se sinta sempre uma necessidade de nos deslocarmos em direcção ao centro, “porque é supostamente o ponto atractivo” da cidade. Com a periferia longe dos radares, fica a perder quem lá está mas também quem nunca lá vai. “Há projectos que simplesmente não têm lugar de fala.” Mas há uma mudança a acontecer. A prova, garante, está nas manifestações que aconteceram no ano passado, em Junho, contra a violência policial e o racismo. Em Lisboa, onde Dino esteve, milhares de pessoas saíram à rua. “Vês as fotos e tens uma mistura de culturas, não vês só negros. Isso é o maior sinal que poderias ter de mudança”, diz, de sorriso contagiante. “Esta é uma luta conjunta pelo mundo todo. É sinónimo de celebração. Se me vierem dizer que se fala disto agora porque é moda, então que todas as modas comecem assim.” O músico não tem dúvidas de que, “graças à luta contra o racismo, todas as lutas ganharam destaque”. E foi por isso também que, em Março, decidiu dar mais um passo. No concerto “Aqui Em Carne e Osso”, para o jornal Público, reuniu activistas para cantar consigo numa instalação do MAKA Lisboa, projecto dedicado às vítimas de injustiça e opressão. “Foi o primeiro momento em que de forma aberta tomei uma posição anti-racista no verdadeiro sentido da palavra”, afirma. “Custa, mas falar em anti-racismo é muito positivo, é não perpetuar algo que estava completamente errado e carimbado na nossa história.”

Da revista para o Centro Cultural de Cabo Verde: Lisboa Negra é agora uma exposição

Mozer

“Sou capaz de estar em Inglaterra e deixar a barba crescer durante meses só para ir ao Mozer. É o meu momento espiritual. O melhor momento do filme Soul – Uma Aventura com Alma é no barbeiro. Só um negro entende o que é aquele barbeiro. Passa tudo por lá. Para nós é como se fosse um ministério, onde vais para falar – o barbeiro funciona como um psicólogo porque é praticamente um ouvinte. Através do Mozer, eu sei o sucesso que estou a ter nas outras ilhas, na diáspora, nos Estados Unidos."

Cova da Moura

  • Coisas para fazer
  • Centros culturais
  • Avenida da Liberdade/Príncipe Real

“Sempre que combino alguma coisa com alguém é aqui. Há alturas em que como cachupa cinco vezes por semana. Sinto que estou num pedaço de Cabo Verde: tem um pequeno jardim com areia vulcânica da ilha do Fogo, as cores, os livros de escritores cabo-verdianos, a música. É um espaço super-importante, principalmente pela dignidade que lhe deram. Só pelo edifício e a homenagem às batukadeiras, já te dá uma sensação de estares a entrar num universo crioulo. E faz todo o sentido estar na Rua de São Bento porque, quando houve a grande migração, os cabo-verdianos, músicos principalmente, concentravam-se muito naquela zona. É uma boa iniciação para depois ir à cachupa da Dona Patriarca [no restaurante O Coqueiro] na Cova da Moura, onde passo horas.”

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MAKA Lisboa

É uma iniciativa de Francisco Vidal e Namalimba Coelho que, através das artes e da palavra, propõe uma conversa visual e social para desafiar as fronteiras do pensamento contemporâneo, descolonizar mentalidades no combate contra a discriminação e o preconceito sob todas as suas formas. “MAKA significa Momento Artístico pela Cultura Africana e fez-me todo o sentido desafiar o MAKA Lisboa para recriar o palco inspirado nos que já tinham apresentado no Iminente e no Maat, no qual estavam representados quatro nomes fundamentais nesta luta pela indiscriminação, em representação de todas as vítimas desta luta coletiva pelo antirracismo, como é o caso do Alcindo Monteiro, da Cláudia Simões, do Bruno Candé e do Giovani Rodrigues.”

Bantumen

“É dos sites mais importantes que apareceu porque eles realmente vão atrás de tudo o que é a cultura afro-portuguesa espalhada pelo mundo e trazem notícias de projectos afrodescendentes dos vários cantos do globo. O que acontecia muito era teres a cultura africana do prisma do branco e logo aí tens um filtro.”

www.bantumen.com

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Broda Music

“É um exemplo de sucesso do que é uma editora feita por músicos, neste caso o Djodje, o Ricky Boy, a Kady e o Mário Marta. É o som que sai dos guetos, como kizomba, afro, house, kuduro, feito nessas periferias, mas depois também têm sede naquela periferia. E torna-se um templo de encontros entre músicos.”

Instagram: @brodamusic. brodamusic@gmail.com

Teatro Griot

“Já cá está há muito tempo e a história de qualquer uma destas pessoas acontece ali. Além disso, fazem sempre momentos de fala e de prosa pós-peça que são muito interessantes. O público pode interagir naquela discussão saudável.

www.teatrogriot.com

Lisboa é uma cachupa rica

  • Coisas para fazer

Formou-se em engenharia, mas é na comunicação que se sente completa. É radialista na Cidade FM, criadora de conteúdos e youtuber. “Batalhei para ir tendo as minhas oportunidades e sei que estou numa posição quase privilegiada nesse sentido, por ter uma voz, mas sei que há uma série de profissionais capazes, negros, que acabam por ficar pelo caminho”, refere.

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Cineasta e activista. Duas facetas de Lolo Arziki praticamente impossíveis de dissociar. Muito do que faz é consequência da sua experiência – por cá, pelo Luxemburgo, por Cabo Verde, pelo Brasil. Tem 29 anos e não dá descanso à luta, mesmo quando a luta parece querer vencê-la pelo cansaço.

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  • Coisas para fazer

Nasceu no Togo, antiga colónia de alemães, franceses e ingleses. Chegou há sete anos a Portugal e, passado pouco tempo, percebeu que a história africana da cidade não era assunto para os de cá, os mesmos que dizem viver numa Lisboa multicultural. Feita de quê? Escravatura, colonialismo, guerra, imigração e outros tantos factores fazem da cidade o que é hoje.

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