“O Vítor [Sanches] sempre trabalhou para a comunidade, tem uma visão forte e quer sempre fazer as coisas de dentro para fora, fazer com que as pessoas venham à Cova da Moura e quebrem estereótipos sobre o bairro. Quando consumo uma t-shirt Bazofo, sei para quem é que esse dinheiro vai. As t-shirts são muito bonitas e de qualidade, feitas por costureiras da Cova da Moura. Não é só uma marca de t-shirts, é uma marca que vai empoderando economicamente outras pessoas envolvidas, além de dar formação a jovens da comunidade. Promove ainda a leitura de autores negros porque crescemos sem referência desses autores. E há o cinema, fizemos aqui o cineclube e estava sempre cheio. Foi o primeiro lugar a receber o meu trabalho, Relatos de uma Rapariga Nada Púdica, sobre ser lésbica no contexto cultural de Cabo Verde. É mais do que uma marca, é um projecto social, político, artístico.”
Cineasta e activista. Duas facetas de Lolo Arziki praticamente impossíveis de dissociar. Muito do que faz é consequência da sua experiência – por cá, pelo Luxemburgo, por Cabo Verde, pelo Brasil. Tem 29 anos e não dá descanso à luta, mesmo quando a luta parece querer vencê-la pelo cansaço, como aconteceu recentemente quando viu o seu filme Sakudi, sobre representatividade queer em Cabo Verde, ser censurado pela Associação de Cinema e Audiovisual de Cabo Verde. Segundo a decisão, Sakudi não promove a diversidade cultural do país. “Mas, quando questionados sobre porque é que um filme que fala sobre pessoas LGBT não respeita um regulamento que diz que se deve promover a diversidade cultural, eles dizem que não entendem como é que falar de pessoas LGBT está relacionado com Cabo Verde”, conta Lolo, que não se deixou ficar e lançou uma campanha de crowdfunding para terminar o projecto. Sentada à porta da Bazofo, na Cova da Moura, Lolo Arziki não quer focar a conversa demasiado em si. Quer antes falar das coisas boas que acontecem ali e noutras zonas pelas mãos de pessoas negras que não se resignam ao lugar da rejeição. Que não vem apenas de fora, mas também da comunidade, muitas vezes por desconhecimento. “Precisamos de nos fortalecer”, diz. E problematiza: “Por conta de toda a pressão racial, a pessoa negra tenta aproximar-se do branco o mais possível para ser aceite e isso implica também consumir o que o branco consome. Mas as condições financeiras não são as mesmas, os nossos acessos não são os mesmos, não temos os privilégios que as pessoas brancas de modo geral têm”. “É uma esquizofrenia, não é saudável, vivemos aqui para ser aceites pela pessoa branca”, atira, reforçando a importância de um consumo consciente. “Não preciso de aceitação dessas pessoas para existir.”
Da revista para o Centro Cultural de Cabo Verde: Lisboa Negra é agora uma exposição