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Silêncio: comece pelo nível 1 e aprenda a cancelar o ruído

Estamos pouco habituados a desligar. Mesmo em momentos reservados, lá está o ruído. Ora som, ora imagem, sempre ligados.

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Em 2021, é difícil ficar a olhar para a parede. Mas é possível. Se estiver destreinado, o melhor é começar com pequenos passos que lhe permitam ouvir melhor o silêncio lá por casa. Por exemplo, e é preciso falar nisto, há quanto tempo não fica sossegado e sentado consigo próprio no trono principal do agregado, sem fazer scroll infinito nas redes sociais ou ter de se apressar por causa dos putos aflitos? E, diga a verdade, há quanto tempo não se demora no duche – que até tem a opção massagem – porque os miúdos estão todos sujos e esperam pela vaga? Já dizia Confúcio (obrigada citador.pt) que “o silêncio é um amigo que nunca trai”. E agora que pode devolver as crianças aos jardins de infância, creches e escolas vai ver que é mesmo um amigo com o qual pode contar e encontrar nas mais pequenas coisas. Neste primeiro nível nem precisa de se esforçar muito. Pode cortar as unhas na varanda na companhia do chilrear da passarada, fazer uma refeição sem olhar para ecrãs e filhos, enquanto recupera todo o potencial das suas papilas gustativas, ou pode ficar sentado, e sossegado, na sanita a olhar para a mini-lasca no azulejo da parede. O silêncio é importante, faz-nos bem à saúde, ao contrário do seu arquinimigo, o ruído, que não é apenas gerado dentro da nossa casa. Vem da rua, do vizinho, e às vezes cai do céu.

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Silêncio: comece pelo nível 1 e aprenda a cancelar o ruído

1. Cancelar o ruído

Com muito mais pessoas enfiadas em casa, o problema do ruído chegou aos ouvidos de mais cidadãos, venha ele de onde vier. O próprio Presidente da República, Marcelo de Sousa, chegou a propor ao Governo a alteração da Lei do Ruído, reduzindo o limite dos níveis de decibéis ou limitando os horários de ruído nos edifícios de habitação. A lei permanece inalterada, mas a iniciativa presidencial foi aplaudida pela associação ambientalista ZERO, que acrescentou, por exemplo, a ideia de limitar as obras não urgentes a um período máximo de quatro horas por dia. “Esta é uma questão chave que desde sempre afectou a qualidade de vida e a saúde dos cidadãos, e que agora se torna mais premente face à maior percentagem de pessoas em teletrabalho. O ruído tem enormes prejuízos para a saúde pública, a começar no incómodo, no agravamento do stress, da hipertensão e diabetes, e no aumento da mortalidade, principalmente através de doenças cardiovasculares para as quais o ruído foi factor de causa e/ou agravamento”, explicou a associação em comunicado, no passado mês de Fevereiro.

A lista de fontes de ruído, identificada pela ZERO, que podem tirar um teletrabalhador do sério incluem o ruído da vizinhança, obras no interior dos edifícios ou actividades que emitam um ruído constante, como estabelecimentos comerciais, de serviços ou industriais. Mas mesmo com o comércio encerrado, ao longo dos últimos meses a associação ambientalista diz ter recebido mais queixas em comparação com outros períodos, “em particular nos períodos de maior confinamento”. Também os carros, os aviões ou os comboios contribuem para a poluição sonora, e monitorizar o ruído é uma ferramenta fundamental para estudar e avaliar os seus efeitos no bem-estar dos cidadãos.

A boa notícia é que agora todos podem contribuir, não só dentro de casa, mas também fazendo parte activa do Projecto Mobilizar, que inclui uma campanha nacional de medição do ruído promovida pela ZERO. E a ferramenta está literalmente na sua mão. “Nós, enquanto cidadãos, apesar de não estarmos munidos com sonómetros, temos os nossos smartphones que nos permitem realizar medições aproximadas e indicativas”, lê-se no site da campanha. Existem apps que substituem um sonómetro. É o caso da NoiseTube (Android) e da DecibelUltra (iOS). E o guia da ZERO explica como fazer as medições e depois fazê-las chegar à associação via email para ajudar a baixar o volume.

2. 10 mandamentos para respeitar o silêncio

A qualidade acústica dos edifícios portugueses não é espectacular, principalmente em edifícios mais antigos, comuns no Porto e em Lisboa. E é muito fácil perdermos a paciência com o vizinho de cima, o de baixo, o do lado e até o da frente, seja porque estamos em teletrabalho, a deitar a criança ou simplesmente porque estamos a precisar do silêncio. Mas às vezes não são os outros, somos nós. Saiba como ganhar a medalha Vizinho da Temporada 2020/2021. Ainda vai a tempo.

1. Use pantufas ou meias para circular dentro de casa e não fazer barulho para o andar de baixo. Um hábito milenar no Japão que deixa tudo o que é germes e bactérias à porta.

2. Coloque adesivos de feltro nos pés das cadeiras para minimizar o barulho proveniente do arrastamento da mobília.

3. Use auscultadores sempre que possível. Ninguém precisa de ouvir as suas videochamadas com a família, muito menos aquela música que não consegue parar de ouvir em loop.

4. Ligue a máquina da roupa durante o dia e não a partir das 22.00, só porque tem um tarifário bi-horário. Quem diz máquina da roupa diz aspirador, os electrodomésticos mais barulhentos lá de casa.

5. Baixe o volume da televisão. Não está a perceber nada do filme que não tem legendas? Tem de ouvir os efeitos sonoros todos do Velocidade Furiosa 137? Ou adopta o ponto n.º 3 desta lista, ou se calhar é melhor ler um livro.

6. Não grite de uma divisão para a outra para comunicar com o restante agregado. Aproveite para andar uns metros e compensar a falta que lhe faz um ginásio.

7. Por falar em ginásio, não salte à corda que o seu 2.º Esquerdo não é nenhuma box de crossfit. Aproveite os passeios higiénicos para se armar em Rocky Balboa.

8. Faça silêncio nas zonas comuns do prédio. O espaço é de todos (e às vezes faz eco) e não é o local perfeito para ficar de conversa com visitas e estafetas.

9. Pendure os quadros na parede durante o dia. Teve uma epifania às 23.00 e já sabe onde vai colocar aquele poster de cinema encaixilhado? Durma sobre o assunto.

10. Não transforme a sua casa num bar ou restaurante. Os convívios sociais são saudáveis, mesmo em casa (assim que for seguro, claro), mas tenha atenção ao ruído que o encontro está a provocar para a restante vizinhança. Música alto e pessoas a falar por cima raramente dão bom resultado.

Cultivar o silêncio

  • Música

Fundador da extinta editora Merzbau, que lançou nomes como B Fachada, Lobster ou Noiserv, Tiago Sousa acabou por seguir um percurso centrado no piano, convidando à introspecção e à meditação. O novo disco, Oh Sweet Solitude, é um regresso a formas mais livres e improvisadas de expressão.

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