Elaborar uma lista de 10 grandes pianistas russos é uma tarefa árdua por duas razões. Uma é que a terra russa é invulgarmente favorável ao despontar de grandes pianistas – uma prodigalidade que, para quem não seja melómano, é ofuscada pela notável aptidão daquelas paragens para gerar tenistas louras e esculturais. Tal abundância obriga, necessariamente, a deixar de fora pianistas de nível equivalente ao dos “escolhidos”.
A outra dificuldade decorre dos contornos nebulosos e mutáveis do adjectivo “russo”: a Revolução de Outubro de 1917 pôs fim ao Império Russo, que, após o período transitório da Guerra Civil, deu lugar em 1922 à União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Com a dissolução da URSS em 1991, muitas das antigas repúblicas soviéticas tornaram-se independentes e o “núcleo central” da URSS, a República Socialista Federativa Soviética Russa deu lugar à Federação Russa, geralmente designada por Rússia. Entre 1917 e 1991, usou-se a expressão “pianista russo” para designar o que, mais rigorosamente, deveria ser “pianista soviético”, uma vez que alguns deles nasceram na Ucrânia ou na Geórgia. Mas como havia uma “escola russa de piano” que vinha do tempo de Tchaikovsky, Anton Rubinstein e Scriabin, o adjectivo “russo” ficou. O fim da URSS veio acabar com esta solução de compromisso na catalogação geográfica e reabrir a questão: poderá classificar-se como “russa” a georgiana Elisabeth Leonskaja (n.1945, Tbilisi)? E que dizer da ucraniana Valentina Lisitsa (n. 1973, Kiev)? Para tornar tudo mais confuso, o carácter repressivo do regime político e o pouco dinamismo do meio musical levou muitos músicos soviéticos a estabelecer-se no Ocidente, adoptando uma nova nacionalidade – por exemplo, Leonskaja é hoje cidadã austríaca, Lisitsa é norte-americana.
Grigory Sokolov em Lisboa
Fundação Calouste Gulbenkian, domingo 8 Abril, 19.00, 30-70€.