★★★★☆ O “teen spirit“ está a fervilhar com “When We Fall Asleep, Where Do We Go?”, um disco de uma cantora-fenómeno, com apenas 17 anos, que esgotou a Altice Arena em três tempos. O futuro da pop é agora – e o último a chegar é um ovo podre.
★★★★☆
A civilização É uma selva com particularidades inesperadas: o que nos sublima neste jargal de moralidade e progresso é também o que amiúde nos enjaula e diminui. Encontrar alguém como Catarina Munhá a serpentear, suave mas libertariamente, por entre fantasmas e ruínas emocionais é, por isso, um acaso feliz e reconfortante. A voz dissimuladamente frágil conduz-nos por canções sonhadoras (“Águas-Furtadas”), feministas (“Isto de Ser Mulher”, em que canta: “Eu ainda não fiz paz/ Com esta coisa de ser mulher/ Sempre quis ser rapaz/ Para fazer o que eu quiser”), eudemonistas (“Sobre Leite Derramado”, um tema desarmante de piano e voz a recusar o hedonismo e o “abismo” do fado: “É difícil a leveza/ Ser feliz é tão pesado/ Bem mais fácil a tristeza/ Sobre o leite derramado”) ou matemáticas (“Variável Independente”). Canções inteligentes, bem urdidas e universais.
Catarina escreve as letras, compõe, canta e toca piano, ukelele e violino. Começou quando contava uns meros cinco anos, o que terá sido decisivo para que Animal de Domesticação não soe a um álbum de estreia. A companhia contribui com outro tanto: três quartos dos PAUS estão aqui (Hélio Morais, Fabio Jevelim e Makoto Yagyu), aos quais se juntam Sérgio Nascimento, André Rosinha, André Henriques ou António Porém Pires, que assina a melíflua “Quem Me Dera Ser Magenta” – uma preciosidade que, sem pretensões a fazê-lo, é uma delicada síntese da música popular portuguesa dos últimos 40 anos. Está no alinhamento certo. Com este disco, Catarina Munhá atira directamente coração da pop nacional e entra em zonas presidenciais, com a tão em voga magistratura do afecto. “Anda cá para este abraço/ Que eu tenho tanto espaço./ Larga essa solidão/ Anda para o rés-do-meu-chão”, canta a fechar. E o que nós temos a fazer é ir sem pruridos.