Cláudia Pascoal
© Pedro MkkCláudia Pascoal
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Cláudia Pascoal: “Sinto que este é o meu primeiro álbum”

A cantora portuguesa Cláudia Pascoal prepara-se para editar ‘!!’ (sim, “dois pontos exclamação”), o sucessor de ‘!’ (2020). Um segundo álbum com sabor a estreia.

Luís Filipe Rodrigues
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Cláudia Pascoal estava entusiasmada. Ia editar o primeiro disco a solo passados poucos dias, e imaginava-se a partilhá-lo com os fãs ao vivo. Era a primeira vez que falávamos e cada palavra que saía da sua boca parecia vir acompanhada por um ponto de exclamação, como aquele que dava nome ao disco. Estávamos na primeira quinzena de Março de 2020. Não imaginávamos o que nos esperava. Ela, em particular, não imaginava que só pudesse tocar ao vivo meses mais tarde e num mundo estranho, onde as distâncias tinham de ser medidas e respeitadas e não se conseguia perceber como as pessoas estavam a reagir às canções por trás das máscaras. Não nos admiramos, por isso, quando diz que lhe parece que só agora é que vai lançar o primeiro álbum – a 19 de Maio chega às lojas e plataformas de streaming e pouco depois, a 24, apresenta-o ao vivo no Teatro Maria Matos, em Lisboa. Os últimos anos foram meio irreais.

“Só agora é que estou a descobrir como é lançar um disco e tocar as canções novas em concerto. Porque no primeiro álbum havia uns reposts e umas stories, mas não tinha mesmo a reacção visual das pessoas. De certa forma até sinto que este é o meu primeiro álbum, porque agora é que estou a sentir este universo.” Percebe-se. Ainda por cima, segundo ela, o novo !! (diz-se “dois pontos de exclamação”) é de certa forma “a continuaçã do primeiro [!, 2020]”. É, também, o primeiro disco que é verdadeiramente dela. No anterior, a maior parte das canções a que emprestou a voz tinham sido escritas por outros artistas; desta feita, todas as músicas foram compostas e todas as letras escritas por ela. Correcção: todas, menos uma, “Eu Jogo Ténis”, originalmente cantada pela Miúda. “Sabes que, quando a oiço, digo: ‘Ah, fui eu que escrevi’. Sinto mesmo que é minha. Só que não”, reconhece. “Foi uma canção que saiu demasiado cedo, o pessoal não a percebeu. Mas fez parte do meu crescimento enquanto artista, entre a primeira tour, quando a comecei a tocar, e hoje.”

Quem também fez parte deste processo de crescimento e autodescoberta foi David Fonseca, que produziu o novo disco e assinou um par de temas incluídos no anterior. Conheceram-se quando a maior parte do país a conheceu, na final do Festival da Canção de 2019. “Claro que fiquei muito contente quando ganhei, mas isso nem foi...” Pausa. “É meio ridículo”. Não faz mal. “[Nesse dia], quase desmaiava e paniquei por completo porque no último momento, já eu estava a arrumar as tralhas para me ir embora, quando chega o David Fonseca e diz que gostou muito de me conhecer. Fiquei histérica. Foi o momento mais feliz.” Ri-se. Rimos os dois. De seguida, confessa que foi também o fundador dos Silence 4 que insistiu para que Cláudia escrevesse as próprias canções, apesar de ela se sentir insegura e pouco preparada, “porque nunca tinha estudado música na vida”.

Ultrapassadas as inseguranças, começaram “a trabalhar juntos, ainda na quarentena. Metade do álbum fizemos de máscara e a uma distância de segurança”, recorda. “Porque eu não entreguei um álbum ao David para [produzirmos] juntos. Eu fui construindo músicas. E, música a música, ia ganhando mais confiança.” Um dos primeiros temas criados nesses dias passados em estúdio foi o “Fado Chiclete”, editado ainda em 2021 e incluído no disco que agora vai lançar. “No primeiro dia de estúdio, ele pede-me para lhe mostrar as músicas e eu tinha três canções em maquetes só com ukelele, gravadas no telemóvel. E as últimas gravações já vinham pré-produzidas por mim. Acho que é a analogia perfeita da minha descoberta. Porque depois de trabalhar tantas horas com o David fui aprendendo a mexer naquilo.” “Nasci Maria”, a música que levou ao Festival da Canção deste ano, era uma dessas últimas; “Pastel de Chaves”, um minuto de delírio hyperpop e electrónica invulgar, onde sampla uma senhora a “explicar como é que se faz o pastel de Chaves”, era outra.

Quando se escuta o disco pela primeira vez, não se percebe bem o que agrega estas canções. Apesar de estranhamente fazerem sentido juntas, apontam em diferentes direcções; ora são electrónicas e estranhas, ora apresentam roupagens e instrumentação clássicas; retintamente portuguesas, mas também muito da internet e até cantadas em espanhol (cortesia de Natalia Lacunza); são carnais e digitais. Às vezes, são isto tudo ao mesmo tempo. A cantora e compositora concorda com esta análise, com estas ideias. “Criar um elo entre todas as canções foi o maior desafio para mim e para o David. Por isso é que este álbum demorou tanto a fazer”, assume. “Era muito importante para mim que as canções não soassem todas iguais, quase como se viessem de álbuns diferentes. Mas acabam por pertencer ao mesmo sítio porque têm a mesma personalidade, a minha.”

A caminhar para os 30 anos, Cláudia é uma filha dos 90s, faz parte de uma geração que cresceu online e nunca se habituou a separar a música que ouvia em caixas estanques. Isso nota-se na música que cria. “Nota-se até o que estava a ouvir quando escrevi cada canção”, acha. “Ouvi coisas muito diferentes naqueles dois anos, porque enjoo muito facilmente de músicas que soam sempre igual. Então estou sempre a mudar de géneros. Mas não é algo muito pensado.” Apenas sentido. “Era o que me apetecia fazer em cada altura, por isso foi o que fiz.” Fez muito bem.

Teatro Maria Matos. Qua 24. 21.00. 15€-18€.

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