“Sempre fui a gorducha da família”. Mafalda Sena, de 31 anos, cresceu rodeada de irmãos e primos. Nas fotografias de família, recorda, “era sempre aquela que se destacava por ser mais gordinha”. Com a idade, foi percebendo que o excesso de peso lhe era prejudicial. Interiorizou que tinha de mudar, e assim foi. Mas tudo a seu tempo – e com muita paciência.
Nasceu em Évora, no dia mais quente do ano de 1986, e vive na aldeia das Ilhas, na freguesia de Arraiolos. Mas não se deixe enganar: o seu alcance – ainda que, aos mais distraídos, possa passar despercebido – não tem fronteiras. Enfermeira há onze anos, Carmen Garcia está agora na linha da frente do combate à pandemia em diferentes serviços, incluindo na Estrutura de Apoio de Retaguarda de Évora, uma antiga residência universitária adaptada para receber utentes com Covid, vindos, por exemplo, de surtos em lares. “Quando entrei de licença de apoio à família, em Janeiro do ano passado, não se ouvia sequer falar do vírus”, partilha. “[Depois] passei de estar em casa para uma loucura de horas em vários sítios.”
É uma heroína, dirá o caro leitor. É, mas não é só por ser profissional de saúde numa altura extraordinária para o mundo inteiro. Com dois filhos, de dois e quatro anos, Carmen também é mãe, ou A Mãe Imperfeita, como ficou conhecida na internet depois de ter criado o blogue homónimo, onde partilha o lado menos romântico da maternidade. “Os miúdos parecem um saco de batatas”, diz-nos. “O pai também é enfermeiro, passamos a vida a tentar desencontrar os nossos turnos e há sempre duas horas onde eles simplesmente não têm para onde ir. É difícil, porque temos de decidir como os trocamos, às vezes é a meio do caminho.” Ainda assim, há sempre tempo para mimos e para lhes contar histórias: foi à hora da sopa que inventou o Era uma vez… Um Vírus, que agora circula por aí em formato digital, para sossegar todas as crianças com perguntas sobre “isto do corona”.
Nas poucas horas livres, das duas, uma: ou está a repor o sono de beleza ou está a espalhar um pouco mais de magia. Apaixonada pelo debate público de questões que interessam ou vão interessando, Carmen é ávida utilizadora das redes sociais e colunista no jornal Público. “Os convites vão surgindo e eu aceito, se fizer sentido. Em breve, vou começar a colaborar num projecto de outro jornal, [dedicado à comunicação de ciência]”, revela. Mais e melhor só se a logística não fosse tão difícil: “Um dia, quem manda ainda vai perceber que uma creche num hospital não é um capricho, é uma necessidade.”
Quem é a mulher que te inspira? “Há tantas [mulheres]. A Florence Nightingale, que mudou o paradigma da enfermagem. E a [socióloga] Maria Filomena Mónica, pela forma despudorada com que sempre viveu e escreveu, incluindo a forma como agora lida com uma doença oncológica.”
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