“Sempre fui a gorducha da família”. Mafalda Sena, de 31 anos, cresceu rodeada de irmãos e primos. Nas fotografias de família, recorda, “era sempre aquela que se destacava por ser mais gordinha”. Com a idade, foi percebendo que o excesso de peso lhe era prejudicial. Interiorizou que tinha de mudar, e assim foi. Mas tudo a seu tempo – e com muita paciência.
Se uma Bimby ajuda muito boa gente lá em casa, não define a vida de um cozinheiro e ai de quem se meta com Ana Leão, Leoa para os amigos, e vá para as suas redes sociais dizer que babkas ou brownies se fazem bem no robot de cozinha. Esta fera da cozinha já é conhecida pelas gentes da área no Porto e está agora de passagem em Lisboa, tendo-se juntado ao colectivo New Kids on the Block, de novos chefs criativos e inconformistas.
Começou por estudar Ciências, mas cedo percebeu que isso não era coisa para ela – queria era enveredar pelas artes culinárias. Estudou na Escola de Hotelaria do Estoril e estagiou nas cozinhas do elBulli, Dos Palillos e do Alkimia. Fartou-se do fine dining e partiu de armas e bagagens para a Austrália, comprou uma carrinha e andou de quinta em quinta a correr o país. “Estive nas apanhas, plantei muitas coisas, cacei, pesquei. Sentei-me à mesa de pessoas de culturas muito diferentes, que me ensinaram muitas técnicas”, conta. Aprendeu a escolher o bom produto, a valorizá-lo e a usá-lo só na sua época, mas também a escolher uma identidade para a sua cozinha, de viagens. Pelo caminho ia voltando a Portugal, fazendo pequenos eventos.
“Quando acabei de dar a volta à Austrália, a ideia era juntar dinheiro e ir para o México ou Peru.” Mas a Covid mexeu nos planos, e veio antes para Portugal. Começou o projecto Colher Torta no Parque da Cidade do Porto no Verão de 2020, um pop-up com muitos pratos para partilhar, e em Outubro juntou-se aos jantares Friendly Fire que Pedro Abril dinamizou no Chapitô, em Lisboa. Pela capital ficou, tendo tomado de assalto a cozinha do Velho Eurico e fazendo agora, em conjunto com José Paulo Rocha, um take-away e delivery em conjunto – todas as semanas muda o menu, mas é sempre para finalizar em casa.
“Sou muito obcecada com a minha comida e só de pensar que pode só chegar ao cliente meia hora depois… nem pensar, é o meu bebé.” Assume-se como “cozinheira de fogão” e aponta a gastronomia do Médio Oriente como uma das suas paixões, gostando de equilibrar pratos e não fazer nada “doce, doce” ou “salgado, salgado”. Quando não sabe o que fazer a seguir, abre um dos muitos livros de cozinha que tem e desbloqueia – o khachapuri que acrescentou ao menu na semana passada é exemplo disso.
Assentar não é com ela e Leão já se está a preparar para, logo que possível, abalar para o plano inicial: primeiro América do Sul, depois Israel, quiçá para ficar.
Quem é a mulher que te inspira?
”Sempre que vou para algum lado, seja Portugal ou outro sítio qualquer apanhar cerejas, tenho a sorte de encontrar figuras femininas que me acolhem, ensinam, dão força. Há uma rapariga que conheci em Melbourne, a Leigh, israelita. Trabalha em festivais, faz catering, tem uma empresa dela, dois filhos, cães e um coelho. E é como se estivesse a fazer malabarismo, mantém os pratos todos intactos.”