“Sempre fui a gorducha da família”. Mafalda Sena, de 31 anos, cresceu rodeada de irmãos e primos. Nas fotografias de família, recorda, “era sempre aquela que se destacava por ser mais gordinha”. Com a idade, foi percebendo que o excesso de peso lhe era prejudicial. Interiorizou que tinha de mudar, e assim foi. Mas tudo a seu tempo – e com muita paciência.
Paula Cardoso iniciou o seu percurso no jornalismo em 2003, na revista Visão. Em 2006 mudou-se para o semanário SOL e, passados seis anos, foi trabalhar para Angola, assumindo o cargo de chefe de redacção do jornal Agora. Regressou a Portugal em 2017. Na sua trajectória como jornalista, cruzou-se apenas com dois colegas não brancos nas redacções portuguesas, o que é sintomático das assimetrias étnico-raciais que minam o país, em várias frentes. “Não é só na comunicação social, é um problema generalizado”, nota Paula.
Foi precisamente para tentar promover uma “maior representatividade negra no mercado profissional” e combater o racismo em Portugal que, em 2019, decidiu desenvolver os seus próprios projectos. Começou com Força Africana, uma série de livros infanto-juvenis que valoriza a cultura africana e tem como protagonistas personagens negras, contrariando as narrativas eurocêntricas e branqueadas da maior parte da literatura para crianças, bem como dos manuais escolares e dos livros de História. “Para mim, a educação é pilar em todas estas discussões”, assinala a autora. “Comecei então por trazer essa diversidade para os mais novos porque percebi que, no meu percurso, houve uma série de processos autodestrutivos que decorreram desse início de vida. A questão de não acreditarmos em nós, de acharmos que estamos sempre aquém.”
A partir de Força Africana, Paula Cardoso diagnosticou “outras ausências”. “Para os livros, tentei – e consegui – encontrar uma ilustradora que tivesse a minha pertença [Irene Filipe Marques], mas foi difícil. Comecei a reflectir sobre o porquê de ser tão difícil.” Da reflexão passou à prática: criou o Afrolink, um site que funciona como uma plataforma de divulgação e promoção de negócios e projectos de profissionais africanos e afrodescendentes em Portugal, tendo também uma vertente informativa, com notícias, artigos ou entrevistas.
“O Afrolink nasce do reconhecimento de que existe uma série de preconceitos em relação aos papéis que os africanos e os afrodescendentes ocupam em Portugal a nível profissional”, diz a jornalista. “Quando este assunto é trazido para cima da mesa com pessoas brancas, elas costumam dizer ‘ah, é porque não há’. O exercício é mostrar que há.” Pessoas, e iniciativas, não faltam – prova disso é que se Paula trabalhasse no projecto a tempo inteiro, publicaria um perfil todos os dias. “Não tenho mãos a medir. Há muita gente com projectos incríveis que não têm qualquer tipo de projecção.”
Além de Força Africana e do Afrolink, Paula Cardoso é uma das anfitriãs das conversas O Lado Negro da Força, todas as quintas no Facebook e no Youtube. Neste momento está ainda a trabalhar na produção de conteúdos para televisão, no universo RTP: o programa Black Excellence Talk Series pode e deve ser visto online. Em breve, trará novidades para a RTP2.
Quem é a mulher que te inspira? “A nível autoral, e que tem a ver com as minhas leituras, escolho a Maya Angelou. A Toni Morrison, que é também uma referência muito importante no meu percurso, e a Angela Davis.”